Zimbábue enfrenta fome causada pelo homem, diz especialista da ONU
Estima-se que insegurança alimentar esteja afetando 5,5 milhões de pessoas nas áreas rurais do país africano; nas áreas urbanas, problema é enfrentado por 2,2 milhões de pessoas.*
Apesar da proteção constitucional do direito à alimentação e de um conjunto sofisticado de leis e políticas nacionais, a fome causada pelo homem está crescendo lentamente no Zimbábue.
O alerta foi feito pela relatora especial sobre o direito à alimentação da ONU, Hilal Elver, após visitar o país de 18 a 28 de novembro de 2019.
Insegurança Alimentar
Elver disse que "mais de 60% da população de um país que antes era visto como o celeiro da África” agora enfrenta a insegurança alimentar. Ela acrescentou que a maioria das famílias são “incapazes de obter comida suficiente para atender às necessidades básicas devido à hiperinflação."
Nas áreas rurais, atualmente, cerca de 5,5 milhões de pessoas estão enfrentando insegurança alimentar, devido a chuvas fracas e padrões climáticos irregulares que afetam as colheitas e os meios de subsistência. Nas áreas urbanas, a insegurança alimentar afeta 2,2 milhões de pessoas, que não têm acesso a serviços públicos mínimos, incluindo saúde e água potável.
Para a relatora, esses "são números chocantes”. Ela alertou que “a crise continua a piorar devido à pobreza e ao desemprego, corrupção generalizada, grave instabilidade de preços, falta de poder de compra, baixa produtividade agrícola, desastres naturais, secas recorrentes e sanções econômicas unilaterais."
Crianças
Mulheres e crianças são as que sofrem mais. A relatora disse que "as mortes de crianças por desnutrição grave têm aumentado nos últimos meses.” Cerca de 90% das crianças do Zimbábue com idades entre seis meses e dois anos não estão consumindo a dieta mínima aceitável.
Em um esforço desesperado para encontrar meios alternativos de subsistência, algumas mulheres e crianças estariam recorrendo a mecanismos que violam seus direitos e liberdades mais fundamentais. Por isso, existe um aumento no abandono escolar, casamento precoce, violência doméstica, prostituição e exploração sexual.
Elver disse que conheceu pessoas nas áreas afetadas pela seca de Masvingo e Mwenezi que comiam apenas uma porção de milho cozido por dia. Mulheres, idosos e crianças mal conseguem satisfazer suas necessidades alimentares mínimas e dependem em grande parte da assistência alimentar, enquanto a maioria dos homens está no exterior em busca de trabalho.
Apelo
A relatora apontou que "sem acesso a uma dieta diversificada e nutritiva, os zimbabuanos rurais, principalmente as crianças mais jovens, mal sobrevivem." Segundo ela, o sistema agrícola e alimentar precisa de reformas imediatas.
Ao fazer um apelo ao governo do país, Elver destacou que é preciso tomar “medidas necessárias para reduzir a dependência do país de alimentos importados, principalmente o milho” e apoiar produções alternativas. Ela acrescentou que o governo deve criar as condições para a produção de sementes tradicionais para garantir a autossuficiência e preparação para os choques climáticos que atingem o país.
Cidades
A crise nas cidades é tão grave quando nas áreas rurais. A especialista da ONU viu os efeitos da crise econômica nas ruas de Harare, capital do país, com pessoas esperando horas em longas filas em frente a postos de gasolina, bancos e fornecedores de água.
Elver também disse que recebeu informações "perturbadoras" de que hospitais públicos têm procurado organizações humanitárias depois que seus próprios estoques de remédios e alimentos esgotarem.
*Os relatores de direitos humanos têm mandato independente das Nações Unidas e não recebem salário pelo seu trabalho.