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ONU pede US$ 5,5 bilhões para combater fome que deve aumentar em 20 países  BR

Um bebê de sete meses é tratado para desnutrição em um centro de saúde no estado de Yobe, Nigéria.
PMA/Arete/Damilola Onafuwa
Um bebê de sete meses é tratado para desnutrição em um centro de saúde no estado de Yobe, Nigéria.

ONU pede US$ 5,5 bilhões para combater fome que deve aumentar em 20 países 

Ajuda humanitária

Novo relatório diz que conflitos e pandemia de Covid-19 são as principais causas da crise; Angola e Moçambique são os únicos países de língua portuguesa que integram lista de nações mais afetadas; Iêmen, Sudão do Sul e norte da Nigéria são as áreas mais graves. 

Sem assistência urgente e ampliada, a fome aguda deve aumentar em mais de 20 países nos próximos meses.  

O alerta é da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, FAO, e do Programa Mundial de Alimentos, PMA, num relatório publicado esta terça-feira.  

Crise global 

Iêmen, Sudão do Sul e norte da Nigéria estão no topo da lista e enfrentam níveis catastróficos de fome aguda, com algumas famílias já em risco de morte.  

David Beasley em visita a hospital no Iêmen
PMA/Mohammed Awadh
David Beasley em visita a hospital no Iêmen

Embora a maioria dos países afetados esteja na África, a fome aguda deve aumentar vertiginosamente na maior parte do mundo: do Afeganistão, na Ásia, à Síria e Líbano, no Oriente Médio passando por Haiti, no Caribe. 

Em todo o mundo, mais de 34 milhões de pessoas lutam contra os níveis de emergência de fome aguda, IPC 4, que significa a um passo da fome. 

Em comunicado, o diretor-geral da FAO, Qu Dongyu, disse que “a magnitude do sofrimento é alarmante.” Para ele, “é responsabilidade de todos agir agora e rapidamente para salvar vidas, proteger meios de subsistência e evitar o pior.” 

Já o chefe do PMA, David Beasley, acredita que três passos são precisos, urgentemente, para impedir que milhões morram de fome. Primeiro, parar os combates, depois, ter acesso a comunidades vulneráveis e, por fim, apoio dos doadores para angariar os US$ 5,5 bilhões necessários para ajuda humanitária.  

Angola 

Angola e Moçambique fazem parte da lista de países onde a insegurança alimentar deve aumentar. 

Em Angola, os principais motivos são condições de seca, desafios econômicos e um surto de gafanhotos do deserto, que devoram as plantações. 

Pandemia terá impacto no desenvolvimento e nos planos que previam a passagem de Angola para economia de desenvolvimento médio
© Unicef Angola/2019/Carlos César
Pandemia terá impacto no desenvolvimento e nos planos que previam a passagem de Angola para economia de desenvolvimento médio

Outra estação seca deve prejudicar as famílias nas províncias do sudoeste do país. A baixa precipitação danificará a produção agrícola, incluindo nas principais regiões produtoras de cereais, bem como a criação de animais. 

Já o surto de gafanhotos do deserto migratórios deve agravar a situação. Relatos iniciais mostram que nuvens gigantes arrasaram várias colheitas na província do Cuando Cubango, no sudeste de Angola, e continuam sendo uma ameaça.  

Atividade empresarial 

Os desafios econômicos por causa da Covid-19, condições de crédito e redução da atividade empresarial são outros empecilhos no caminho. 

O relatório prevê um aumento do preço dos alimentos e informa que o valor cobrado pela farinha de mandioca e de milho, os principais alimentos básicos do país, já subiu 30% e 25% no ano passado, respectivamente.  

As agências estimam que 1 milhão de pessoas sofrerão de insegurança alimentar em 2021, cerca de 17% acima da média de cinco anos.  

Em Moçambique, os principais fatores são tempestades e ciclones, a crise da Covid-19 e a insegurança na província de Cabo Delgado 

Os desastres naturais causaram deslocamentos e destruíram infraestrutura e colheitas. Segundo avaliações iniciais, 100 mil hectares de terras cultivadas foram afetados. Nas províncias do sul, os agricultores não tiveram sementes suficientes para uma segunda temporada. 

Moçambique: crise crescente em Cabo Delgado continua sem atenção do mundo

Cabo Delgado 

Em Cabo Delgado, a violência abrandou em janeiro e fevereiro, mas deve se intensificar com o fim da estação das chuvas esse mês, aumentando o número de deslocados, que estava em 668 mil no final do ano passado.  

Um total de 2,9 milhões de pessoas devem enfrentar altos níveis de insegurança alimentar aguda, IPC Fase 3 e acima, entre janeiro e março. O valor está acima dos 2,7 milhões de pessoas nos três meses anteriores. 

Esse número deve diminuir para 1,7 milhão entre abril e setembro, devido à época das colheitas e tendência de redução dos preços dos alimentos, mas as agências alertam para o possível impacto de vários fatores. 

Apesar do aumento do apoio humanitário, a resposta tem sido dificultada por várias restrições, como insegurança e fortes chuvas.  

Causas 

Em todo o mundo, conflitos e a pandemia de Covid-19 são as principais causas da crise alimentar. 

A situação de violência pode prolongar-se, ou aumentar, em partes do Afeganistão, República Centro-Africana, Sahel Central, Etiópia, norte da Nigéria, norte de Moçambique, Somália, Sudão do Sul e Sudão. 

A crise de saúde deve seguir ao redor do mundo. A América Latina, a mais afetada pelo declínio econômico, será a mais lenta para se recuperar. Iêmen, Síria e Líbano sofrem com uma rápida depreciação da moeda e inflação vertiginosa. 

Praga dos gafanhotos do deserto continuará aumentando o risco de danos às pastagens e às plantações
© FAO/Haji Dirir
Praga dos gafanhotos do deserto continuará aumentando o risco de danos às pastagens e às plantações

Os extremos climáticos e o fenômeno La Niña provavelmente continuarão em abril e maio. Os surtos de gafanhotos do deserto na África Oriental e na costa do Mar Vermelho continuam a ser preocupantes e podem chegar a partes da África Austral, arrasando as colheitas de verão. 

Ação urgente 

O relatório recomenda ações de curto prazo em cada um dos locais mais afetados.  

As propostas vão desde o aumento da assistência alimentar, à distribuição de sementes, tratamento e vacinação dos rebanhos, esquemas de trabalho em troca de dinheiro e reabilitação de estruturas de coleta de água.  

Segundo as agências, a produção agrícola é essencial, especialmente onde o acesso é limitado e as pessoas dependem da produção local.