ONU revela "horrores inimagináveis" vividos por migrantes e refugiados na Líbia
Relatório da ONU menciona abusos e violações; centros de detenção estão superlotados; migrantes são vítimas atividade de criminosos, traficantes e contrabandistas que contam com cumplicidade de autoridades do Estado líbio.
Os migrantes e refugiados que entram na Líbia são submetidos a “horrores inimagináveis.”
A conclusão é de um relatório publicado conjuntamente pela Missão de Apoio da ONU na Líbia, Unsmil, e pelo Escritório de Direitos Humanos da ONU, que dá conta das violações e abusos cometidos por uma série de funcionários do Estado, grupos armados, contrabandistas e traficantes contra migrantes e refugiados.
Testemunhos
Estes incluem assassinatos, tortura, detenções arbitrárias, violações em grupo, escravidão, trabalho forçado e extorsão.
O relatório da ONU tem como base 1,3 mil testemunhos recolhidos pela equipa de direitos humanos da ONU na Líbia, bem como de migrantes que regressaram à Nigéria ou chegaram à Itália.
O documento analisa as viagens de migrantes e de refugiados desde a fronteira sul da Líbia, através do deserto, até à costa norte, uma viagem “marcada pelo risco considerável de graves violações dos direitos humanos e abusos em todas as etapas do caminho”.
Os especialistas da ONU concluem também que o clima de ilegalidade na Líbia facilita as atividades ilícitas, tais como tráfico de seres humanos e o contrabando, e deixa migrantes e refugiados “à mercê de inúmeros predadores que os veem como mercadorias a serem exploradas e extorquidas.”
Segundo o documento, a esmagadora maioria das mulheres e adolescentes entrevistadas pela Unsmil confessaram ter sido violadas por contrabandistas ou traficantes.
Centros de Detenção
Os funcionários da ONU visitaram 11 centros, onde milhares de migrantes e refugiados estão detidos, documentaram tortura, maus tratos, trabalho forçado e violações. Os relataram indicam que as mulheres são frequentemente mantidas em instalações sem guardas femininas, potenciando o risco de abuso sexual e de exploração.
Aqueles que conseguem fazer a perigosa travessia do Mediterrâneo, muitos são intercetados ou resgatados pela Guarda Costeira da Líbia, que os transfere de volta para o país.
O relatório afirma que a Líbia não pode ser considerada um local de segurança após o resgate ou interceção no mar, dado o risco considerável de estar sujeito a violações graves dos direitos humanos.
O relatório assinala que a União Europeia e os seus Estados-membros continuam a adotar políticas de redução da entrada na Europa, o que contribui para que milhares de pessoas continuem retidas na Líbia.
Os migrantes mantidos nos centros são sistematicamente sujeitos a agressões severas, queimados com objetos quentes de metal, eletrocutados e submetidos a outras formas de maus-tratos. O objetivo é extorquir dinheiro às suas famílias através de um complexo sistema de transferências monetárias.
A ONU informa também que os centros de detenção estão superlotados, carecem de ventilação, de iluminação e de instalações sanitárias.
Apelo
Além da violência e dos abusos cometidos, muitos migrantes sofrem de desnutrição, infeções de pele, diarreia aguda, infeções respiratórias e outras doenças, sem acesso a tratamento médico inadequado. As crianças são mantidas com adultos nestas mesmas condições miseráveis.
O relatório aponta para a aparente “cumplicidade de alguns atores estatais, incluindo autoridades locais, membros de grupos armados formalmente integrados em instituições estatais e representantes do Ministério do Interior e do Ministério da Defesa, no contrabando ou tráfico de migrantes e refugiados.”
O representante especial do secretário-geral e chefe da Unsmil, Ghassan Salamé, afirmou que “há uma falha local e internacional em lidar com esta calamidade humana escondida que continua a ter lugar na Líbia."
Muitas pessoas são mantidas em centros não-oficiais e ilegais dirigidos diretamente por grupos armados ou grupos criminosos. Eles são frequentemente vendidos de um grupo criminoso para outro e obrigados a pagar vários resgates. O relatório adianta ainda que “inúmeros migrantes e refugiados perderam a vida durante o cativeiro depois de serem baleados, torturados até a morte ou simplesmente deixados a morrer de fome ou por negligência médica."
A alta comissária da ONU para os Direitos Humanos considera que “a situação é absolutamente terrível". Michelle Bachelet lembra que é necessário combater “a impunidade desenfreada” para acabar com o sofrimento de dezenas de milhares de pessoas, mas também “minaria a economia paralela ilícita” construída sobre o abuso dessas pessoas.
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