Fome é usada como método de guerra no Sudão do Sul, diz relatório
Comisssão da ONU detalha como forças do governo privaram comunidades rurais de recursos; cerca de 7,5 milhões de pessoas precisam de ajuda humanitária; insegurança alimentar agrava problemas como corrupção, divisões étnicas e violência.
Forças do Governo do Sudão do Sul estão privando comunidades que vivem em áreas controladas pela oposição de recursos necessários para sua sobrevivência. Esta ação é uma tática que usa a fome como método de guerra.
A conclusão é da Comissão de Direitos Humanos no Sudão do Sul, que publicou esta terça-feira um relatório sobre a situação no país que conquistou sua independência em 2011.
Recursos
Segundo o documento de 46 páginas, entre janeiro de 2017 e novembro de 2018, as forças do governo privaram as comunidades Fertit e Luo, no estado de Bahr el Ghazal, de recursos críticos.
Os comandantes do governo também autorizaram seus soldados a se recompensarem com a pilhagem de objetos essenciais à sobrevivência dessas populações rurais.
Desde 2013, o conflito causou sofrimento incalculável à população civil, resultando em níveis impressionantes de insegurança alimentar aguda e desnutrição. Cerca de 7,5 milhões de pessoas precisam de assistência humanitária.
Em comunicado, a presidente da Comissão, Yasmin Sooka, disse que “a insegurança alimentar nos estados de Bahr el Ghazal Ocidental, Jonglei e Equatória Central está diretamente ligada ao conflito e, portanto, tendo quase inteiramente causa humana.”
Para ela, “é bastante claro que tanto o governo quanto as forças da oposição usaram a fome de civis como método de guerra, às vezes como um instrumento para punir comunidades não alinhadas, como no caso de Jonglei.”
Tanto o governo quanto as forças da oposição usaram a fome de civis como método de guerra, às vezes como um instrumento para punir comunidades não alinhadas
Abusos
Ao longo de vários anos, ataques foram realizados contra várias cidades e vilas em todo o estado de Bahr el Ghazal Ocidental, o que resultou em um número significativo de mortes, estupros e destruição, incêndios e saque de propriedades.
Segundo o membro da comissão Andrew Clapham, “a insegurança alimentar agravou a insegurança física, deixando os civis sem outra alternativa a não ser fugir.”
O relatório afirma que essas violações fazem parte de um ataque generalizado ou sistemático dirigido contra a população civil e podem ser considerados crimes contra a humanidade.
Para abordar essas e outras violações e crimes documentados pela Comissão, também foi divulgado um relatório sobre justiça e responsabilidade.
O relatório deve servir como um roteiro para implementar os principais compromissos assumidos no Acordo de Paz Revitalizado, que é um pilar fundamental da transição do Sudão do Sul.
Justiça
Para o membro da comissão Barney Afako, “o fracasso em abordar as causas do conflito alimentou a competição política pelos recursos, a corrupção entre as elites que impulsionam as divisões étnicas e a violência, e aprofundam a impunidade no país.”
Afako afirmou que “sem a implementação de um processo de justiça inclusivo e completo, conforme previsto no Acordo de Paz, a paz sustentável continuará sendo uma ilusão.”
A Comissão de Direitos Humanos no Sudão do Sul foi estabelecida pelo Conselho de Direitos Humanos em março de 2016.
Seu mandato é determinar, coletar e preservar evidências sobre responsabilidade por alegadas violações graves e abusos dos direitos humanos e crimes relacionados, incluindo violência sexual e de gênero e violência étnica.