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Atriz Cate Blanchett diz que nada a podia preparar para o sofrimento em Cox’s Bazar

Cate Blanchett fala ao Conselho de Segurança.
ONU/Manuel Elias
Cate Blanchett fala ao Conselho de Segurança.

Atriz Cate Blanchett diz que nada a podia preparar para o sofrimento em Cox’s Bazar

Direitos humanos

Embaixadora da Boa Vontade australiana e secretário-geral da ONU informaram o órgão sobre situação de refugiados no Bangladesh; no último ano, mais de 700 mil pessoas fugiram de Mianmar e encontraram refúgio no país asiático.

A atriz australiana Cate Blanchett e o secretário-geral da ONU, António Guterres, falaram esta terça-feira sobre a situação dos refugiados rohingya, no Bangladesh, ao Conselho de Segurança.

Blanchett começou o seu discurso dizendo que estava presente “não como especialista, mas como testemunha”.

Ela explicou que viu o que se está a passar, e agora não pode passar ao lado. A embaixadora da Boa Vontade do Acnur visitou o país asiático em março e, segundo ela, nada a “poderia ter preparado para a extensão e profundidade do sofrimento” que viu.

ONU News
Refugiados rohingya: Guterres afirma que “não pode haver desculpas". ”

Relatos

Já o secretário-geral António Guterres disse que o fluxo de refugiados que começou no ano passado “se tornou uma das piores crises humanitárias e de direitos humanos do mundo. ”

O chefe da ONU lembrou a sua visita do mês passado aos campos de Cox’s Bazar, no Bangladesh, dizendo que ouviu historias horríveis de perseguição e sofrimento.

Um dos refugiados disse-lhe que o seu filho tinha sido morto à sua frente, que a sua mãe tinha sido assassinada e sua casa queimada. O homem refugiou-se numa mesquita, mas foi encontrado por soldados, que o estupraram e queimaram o Corão. 

Cate Blanchett e António Guterres na sede da ONU, em Nova Iorque.
Cate Blanchett e António Guterres na sede da ONU, em Nova Iorque. , by ONU/Evan Schneider

Perseguição

Blanchett contou a história de Leila, e do seu filho Yoseph, que tiveram de fugir da sua aldeia depois de esta ter sido queimada. Os dois nunca mais viram seu pai e marido, que desapareceu, e Yoseph ainda tem cicatrizes de quando sua casa ardeu e ele estava dentro dela.

A atriz lembrou que esta não é a primeira onda de refugiados rohingya e que, neste momento, vivem mais pessoas desta minoria fora de Mianmar do que no seu país. Cate Blanchett disse que os refugiados “veem Mianmar como sua casa, mas têm medo de regressar. ”

Segundo ela, “estas pessoas não podem regressar às mesmas condições que os obrigaram a fugir. ” Ela acredita que a atribuição de nacionalidade é a principal condição para resolver o problema, considerando que “não existe uma picada. ” 

Solidariedade

Blanchett disse também que o acolhimento de mais de 700 mil pessoas, no espaço de poucos meses, por parte das pessoas e autoridades de Bangladesh “é um dos maiores gestos de humanidade do nosso tempo. ” E perguntou, se pessoas com tão pouco fazem tanto, porque é que o mundo não pode ajudar mais.

Embaixadora da Boa Vontade do Acnur, Cate Blanchett, em Cox’s Bazar, no Bangladesh.
Embaixadora da Boa Vontade do Acnur, Cate Blanchett, em Cox’s Bazar, no Bangladesh., by UNHCR/Hector Perez

Regresso

O secretário-geral lembrou um memorando de entendimento entre o Agência da ONU para Refugiados, Acnur, o Programa da ONU para o Desenvolvimento, Pnud, e as autoridades de Mianmar sobre o regresso dos rohingya. Mas disse estar  “claro que as condições para um regresso seguro, voluntário e digno ainda não existem.”

Segundo ele, “enquanto o clima de medo e perseguição prevalecer, o retorno voluntário não vai acontecer. ”  Ele pediu o fim de padrões de violações contra as minorias étnicas e religiosas.

Colaboração

Guterres pediu que o Conselho de Segurança pressione o país para que colabore com a ONU, dê acesso sem restrições às agências humanitárias e liberte os jornalistas detidos. Guterres afirmou que “não pode haver desculpas. ”

O chefe da ONU agradeceu o que chamou de “generosidade tremenda” das autoridades e comunidades de Bangladesh, lembrando que o financiamento para a resposta humanitária ainda está a 33%.

Segundo ele, “os refugiados precisam de mais acesso à educação e aos meios de subsistência para evitar vulnerabilidade ao risco de tráfico, exploração sexual e radicalização. ”

Após destacar que não consegue esquecer as histórias que ouviu na sua viagem, Guterres lembrou uma mulher que segurava o filho, resultado de um estupro, e que lhe pediu “justiça para as irmãs, filhas e mulheres que sofreram. ”

Guterres ouviu relatos de assassinatos de crianças em frente dos país.
Guterres ouviu relatos de assassinatos de crianças em frente dos país., by Unfpa Bangladesh/Allison Joyce

Responsabilidade

Guterres referiu as conclusões do relatório da Missão Internacional Independente de Apuração dos Fatos em Mianmar, publicado segunda-feira. O documento destaca que seis generais das Forças Armadas de Mianmar devem ser julgados por crimes de genocídio, de guerra e contra a humanidade.

O secretário-geral afirmou que estas conclusões “merecem considerações sérias por todos os organismos competentes da ONU” e que “a cooperação internacional é necessária para garantir que o país cumpra a lei internacional. ”

Além da atriz e do chefe da ONU, participam no encontro o administrador assistente do Programa da ONU para o Desenvolvimento, Pnud, Tegegnework Gettua. A reunião foi presidida pelo ministro de Estado para a Commonwealth e ONU do Reino Unido, Lord Ahmad.