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Relatora elogia lei de reparação no Brasil para famílias separadas pela hanseníase

Profissionais de saúde visitam comunidades no Brasil para conscientizar sobre a prevenção e controle da hanseníase
Opas
Profissionais de saúde visitam comunidades no Brasil para conscientizar sobre a prevenção e controle da hanseníase

Relatora elogia lei de reparação no Brasil para famílias separadas pela hanseníase

Saúde

País avança com indenizações para filhos que foram afastados dos pais entre 1923 e 1986; cerca de 16 mil crianças passaram por segregação forçada, algumas ainda com paradeiro desconhecido; relatora da ONU parabeniza mobilização da sociedade civil no tema; coordenador de ONG relata expectativas com nova lei. 

A relatora especial da ONU* para a Eliminação da Discriminação contra Pessoas Afetadas pela Hanseníase elogiou nesta sexta-feira os avanços legislativos no Brasil para proteger e promover os direitos humanos das crianças separadas dos pais afetados pela hanseníase.

Beatriz Galarza parabenizou “todos os defensores dos direitos humanos, incluindo o Movimento Nacional para a Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase, Morhan, por esta conquista”.

Política de segregação

O ex-coordenador nacional do Morhan, Artur Custodio, conversou com a ONU News e destacou que a política de segregação ligada à doença persistiu mesmo depois do avanço da ciência e o desenvolvimento da cura. Ele explicou a importância e o alcance da nova lei. 

“No caso do Brasil e vários outros países, as pessoas podiam ter filhos, mas os filhos eram retirados delas. E muitos não se sabe o paradeiro, é preciso fazer banco genético. Então o presidente Lula em 2007 fez por medida provisória uma indenização para as pessoas afetadas pela hanseníase que ficaram isoladas em colônias. E agora, em 2023, cumpre uma segunda etapa, dando uma indenização, uma reparação pelo crime de Estado também para os filhos que foram tirados dos pais e por outro lado complementando a lei do passado e dando a reparação também para aquelas pessoas que foram isoladas na floresta Amazônica e que não tinham sido reconhecidas porque não ficaram em hospitais”.

Artur Custódio, ex-coordenador Nacional do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase, Morhan
Morhan
Artur Custódio, ex-coordenador Nacional do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase, Morhan

Medidas de reparação 

Para Custodio, este é “um importante passo da justiça de transição”. Porém, o ativista defende que outros passos são ainda necessários, como a melhoria do acesso à saúde, à assistência social e a preservação da memória.   

Entre 1923 e 1986, cerca de 16 mil crianças foram separadas dos pais que sofriam de hanseníase e enviadas para abrigos, sob a política de segregação forçada vigente no Brasil na época.

Em 24 de novembro de 2023, em linha com as recomendações anteriores das Nações Unidas, o presidente do Brasil assinou uma lei que estipula que a bolsa mensal paga às pessoas com hanseníase não pode ser inferior ao salário-mínimo.

A nova legislação determina ainda que as crianças que foram separadas dos pais também podem receber o auxílio como medida de reparação.

Luta de décadas

A relatora especial incentivou o governo brasileiro a “implementar esta lei com os recursos e estruturas necessárias e a garantir que os casos sejam examinados e decididos pela comissão interministerial de forma rápida e eficaz”.

Estas crianças separadas têm lutado por reparações por parte do Estado e apresentaram vários processos em tribunais estaduais ao longo da última década.

Segundo Beatriz Galarza, “o Brasil não foi exceção”, ressaltando que crianças também foram separadas dos pais e cuidadores e excluídas da sociedade por causa da hanseníase em muitos outros países. 

Exemplo a ser seguido

Como resultado, muitas pessoas que sofreram estas violações não têm acesso a um nível de vida adequado e à autonomia econômica, e muitas enfrentam “deficiências psicossociais que dificultam a sua inclusão social”.

A especialista da ONU instou outros Estados a seguirem o exemplo do Brasil e fornecerem com urgência reparações simbólicas e materiais e o apoio necessário às pessoas que, quando crianças, foram separadas de seus pais afetados pela hanseníase e segregadas da sociedade.

*Os relatores especiais trabalham de forma voluntária e não recebem salário pelo seu trabalho.