Piora a situação de direitos humanos no Mali
Especialista independente das Nações Unidas alerta para aumento da violência e da censura desde março; segundo ele, grupos extremistas que controlam grande parte do país são os principais autores.
Após 10 dias de visita ao Mali, um relator independente da ONU* expressou séria preocupação com o ressurgimento da violência extremista e a rápida deterioração da situação dos direitos humanos no país.
Alioune Tine destacou o ressurgimento e a frequência de ataques e violências cometidos por grupos extremistas que atuam no norte do país, no centro e nos arredores da capital Bamako. Esses grupos controlam 75% do território.

Grupos extremistas
Durante sua visita, Tine se reuniu com autoridades malianas, sociedade civil e associações de vítimas, organizações não governamentais, diplomatas e agências das Nações Unidas.
O especialista da ONU disse que a situação de segurança e direitos humanos se deteriorou de forma alarmante desde março de 2022.
De acordo com a Missão de Paz das Nações Unidas no Mali, Minusma, foram mais de 1,3 mil violações e abusos de 1º de janeiro a 30 de junho, um aumento de cerca de 47% em relação ao ano anterior.
Segundo ele, grupos extremistas violentos continuam sendo os principais autores de violações e abusos de direitos humanos no Mali, mas o alto número de violações atribuídas às forças de defesa e segurança malianas é muito preocupante.

Militares estrangeiros
O relator citou “fontes confiáveis” informando que violações foram cometidas pelas forças de segurança malianas, acompanhadas por militares estrangeiros.
Ele acrescentou que as “autoridades malianas continuam negando relatos de que uma empresa militar privada russa estaria operando ao lado das forças de segurança, insistindo que elementos russos presentes no país são instrutores militares destacados no âmbito de uma cooperação bilateral.”
Para ele, “independentemente do status dos militares estrangeiros, o Mali deve, de acordo com suas obrigações internacionais de direitos humanos, agir com a devida diligência para prevenir, investigar e punir violações e abusos de direitos humanos”.

Censura
O especialista disse ter ficado chocado com o encolhimento contínuo do espaço cívico, incluindo a censura da mídia e a autocensura de jornalistas, profissionais da mídia e representantes da sociedade civil por medo de represálias.
Para ele, a autocensura é resultado do medo de represálias das autoridades de transição malianas e seus apoiadores.
Tine instou as autoridades malianas a concederem às organizações e instituições nacionais e internacionais acesso a áreas, onde foram cometidas violações e abusos de direitos humanos, para que possam investigar e denunciar situações de forma independente.
Falhas da proteção
O especialista também disse que o Mali também deve garantir que as vítimas recebam reparações justas e efetivas pelos danos que sofreram.
Ele pediu às autoridades de transição do Mali e aos parceiros internacionais que reajustem urgentemente as respostas e estratégias de segurança que falharam em proteger efetivamente as populações civis e seus direitos humanos fundamentais.
O especialista da ONU elogiou o progresso recente para restaurar a ordem constitucional no Mali e implementar o Acordo de Paz e Reconciliação de 2015, apesar dos desafios persistentes.

Nova lei eleitoral
Ele destacou que o caminho para o retorno à ordem constitucional no Mali inclui a promulgação de uma nova lei eleitoral e o estabelecimento de uma comissão de redação da constituição em junho de 2022.
Durante uma reunião para decidir sobre aspectos do acordo de paz realizada em agosto de 2022, chegou-se a um consenso sobre a integração de 26 mil ex-combatentes nas Forças Armadas e nos serviços do Estado.
No entanto, Tine alertou que o Mali enfrenta sérios desafios de segurança.
Recomendações
Tine recomendou que as autoridades malianas, a comunidade africana e a comunidade internacional mantenham um diálogo construtivo para garantir a estabilidade e segurança do Mali, fortalecer os esforços para proteger a população civil e evitar o isolamento do país.
Ele também insistiu na urgência de apoiar a restauração da autoridade do Estado em todo o Mali.
Tine apresentará seu relatório anual ao Conselho de Direitos Humanos em março de 2023.
*Os relatores de direitos humanos são independentes das Nações Unidas e não recebem salário pelo seu trabalho.