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Íntegra do discurso do presidente de Moçambique na Assembleia Geral

O presidente de Moçambique Filipe Jacinto Nyusi no debate geral da Assembleia Geral.
ONU/Eskinder Debebe
O presidente de Moçambique Filipe Jacinto Nyusi no debate geral da Assembleia Geral.

Íntegra do discurso do presidente de Moçambique na Assembleia Geral

Assuntos da ONU

Vídeo do discurso do presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, no segundo dia do debate geral da Assembleia Geral de líderes internacionais em Nova Iorque. Leia o discurso na íntegra. 

Discurso de Moçambique na 75a Assembleia Geral da ONU

 

Senhor Presidente da 75ª Sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas; Senhor Secretário-Geral das Nações Unidas; Suas Excelências Chefes de Estado e de Governo Excelências Chefes de delegações; Minhas Senhoras e Meus Senhores!

É com elevado regozijo que, em nome do Povo Moçambicano e em meu próprio, dirijo-me, à comunidade internacional, neste Debate Geral, que ocorre num momento tão histórico quanto simbólico da celebração do 75º Aniversário da Organização das Nações Unidas.

Para a República de Moçambique, este aniversário coincide com o 45ºaniversário da aceitação, isto é, adesão do nosso país, como membro legítimo e de pleno direito, desta Organização, que nos outorga o nosso honroso lugar na comunidade internacional.

Gostaria de reconhecer Sua Excelência Embaixador Tijjani Mommad Bande, Presidente da 74ª Sessão da Assembleia Geral, pelo seu desempenho e felicito a Vossa Excelência Volkan Bozkir, Presidente da presente Sessão da Assembleia Geral e manifesto a disponibilidade do meu país de colaborar para o sucesso do vosso mandato.

Saúdo calorosamente ao Senhor António Guterres, Secretário-Geral das Nações Unidas, pelo seu incansável empenho na defesa dos ideais consagrados na Carta das Nações Unidas; colocando as Nações Unidas na liderança de esforços colectivos para superar os desafios contemporâneos, incluindo as suas iniciativas, visando fazer face à pandemia da COVID-19.

Senhor Presidente,

Excelências!

O mundo de hoje é, marcadamente, diferente daquele que existiu quando se fundou a ONU. Houve melhorias significativas no nosso bem-estar colectivo. Os indicadores sociais e de desenvolvimento humano melhoraram substancialmente. A esperança de vida aumentou, a mortalidade e morbidade reduziram, o número de Estados Membros quase quadruplicou, passando de 51 para 193 países, incluindo Moçambique. Os esforços com vista ao empoderamento da mulher são uma realidade que se vai aprofundando.

O lema desta Assembleia Geral, traduz, fielmente, a essência das Nações Unidas e constitui um apelo à renovação da visão de um mundo integrado e sinérgico, onde as nações se exprimam de forma aberta e actuem de forma coordenada na promoção do desenvolvimento sustentável e inclusivo, tendo como estandarte a Agenda 2030.

Por isso, Moçambique defende os pressupostos de “responsabilidade comum, mas diferenciada”, bem como os objectivos de desenvolvimento internacionalmente acordados, à luz da Declaração de Paris sobre a Eficácia da Ajuda ao Desenvolvimento”.

Tudo isso mostra que a cooperação multilateral continua a ser a melhor abordagem para fazer face aos desafios e minorar o sofrimento das pessoas que são o principal motivo da criação das Nações Unidas.

O multilateralismo no âmbito das Nações Unidas é, ainda, fundamental se considerarmos que a economia do mundo, sobretudo a dos países em desenvolvimento, foi severamente dilacerada pelos efeitos da pandemia da COVID19, sendo que a sua restauração exige intervenções globais, integradas e concertadas.

O nacionalismo e o isolacionismo em face de uma pandemia, são quanto a nós, uma receita para o fracasso na resposta a esta e outras doenças contagiosas de natureza imprevisível. 

Outros fenómenos e desafios globais que clamam pela intervenção multilateral, liderada pelas Nações Unidas, incluem o terrorismo, mudanças climáticas, segurança cibernética, saúde pública, pesquisa e desenvolvimento, comércio e industrialização.

Na aldeia global em que vivemos, as questões nacional e internacional, são cada vez menos discerníveis. A natureza transnacional e interligação destes fenómenos, exigem uma liderança que reconheça que, no mundo actual, as nossas intervenções devem ter em conta a relação intrínseca entre o cidadão nacional, regional e global.

Senhor Presidente, Excelências!

Moçambique saúda e reafirma o seu apoio às acções do Secretário-Geral, visando a reforma das Nações Unidas, nas vertentes da paz e segurança, operações de paz, desenvolvimento e da gestão da organização.

Apesar disso, preocupa-nos a falta de progressos nas negociações intergovernamentais para que a reforma do Conselho de Segurança tenha resultados consentâneos com o Século XXI.

A reforma tem o mérito de colocar a paz, segurança e estabilidade internacionais como catalisadores da agenda global de desenvolvimento, bem como tornar a ONU mais representativa, eficiente e transparente, em função da situação geopolítica contemporânea, o que pode conferir maior eficácia e legitimidade às decisões deste órgão.

Por isso, mais uma vez, apelamos à comunidade internacional a usar este momento histórico dos 75 anos da nossa organização universal para conjugar esforços para uma solução sustentável das questões pendentes relativas à segurança.

Senhor Presidente, Excelências!

A Agenda 2030 e os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável são instrumentos que alimentam a esperança de biliões de pessoas do mundo inteiro no alcance do tão almejado progresso e bem-estar de todos os povos. Neste quadro, Moçambique apresentou, em Julho de 2020, o seu primeiro Relatório Nacional Voluntário sobre os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável, que partilha realizações em função das aspirações do Povo Moçambicano, em cumprimento deste instrumento internacional reflectido no nosso Programa Quinquenal de Governo 2020-2024.

“O Futuro que queremos” reside nas acções do presente; as “Nações Unidas que precisamos” dependem da nossa postura e acção responsável, hoje e amanhã. Somente com uma abordagem colectiva e com humanismo, lograremos implementar, com sucesso, a agenda de inclusão e de “não deixar ninguém para trás” que escolhemos.

É neste contexto que o Governo de Moçambique promove a consolidação da paz, a preservação dos direitos humanos, a justiça social, a igualdade e a equidade de género, a inclusão de jovens e de pessoas com deficiência nos programas de desenvolvimento, cimentando a unidade e partilha de benefícios, apanágio da nossa governação.

No que se refere às alterações climáticas, devido à sua localização geográfica, Moçambique tem sido ciclicamente assolado por eventos extremos. Anualmente, o país tem sofrido ciclones, cheias e secas e ainda estão frescas as memórias dos ciclones Idai e Kenneth, ocorridos em Março e Abril de 2019.

Mais de um ano depois, continuamos os esforços de reconstrução e recuperação dos danos sócio-económicos, conjugados com as medidas de adaptação e resiliência, à luz das práticas internacionalmente aceites, no quadro do Acordo de Paris sobre Mudanças Climáticas de que somos parte, desde Junho de 2018.

Aproveitamos o momento para reiterar a nossa gratidão à comunidade internacional pelo apoio prestado durante e após a ocorrência dos ciclones.  Moçambique continua a promover a gestão sustentável da biodiversidade e dos ecossistemas e recursos naturais, com o propósito de acrescentar valor ao desenvolvimento local integrado das comunidades. Neste sentido, a promoção das áreas de conservação, em território nacional, continua a merecer a nossa especial atenção.

Por outro lado, temos procurado expandir o acesso à energia eléctrica para o consumo doméstico e industrial, através de fontes limpas e renováveis, quer sejam as centrais termo-eléctricas movidas a gás natural, eólica e solar, para além da energia hídrica, no intuito de garantir o cumprimento da meta de acesso universal, até 2030. Actualmente, todas as 154 sedes distritais encontram-se ligadas à rede de energia eléctrica, estando a decorrer o programa de electrificação dos Postos administrativos.

Reconhecendo o papel da agricultura para este efeito, o Governo decidiu alocar, pela primeira vez, 10% do seu orçamento anual a este sector, em consonância com a Declaração de Maputo sobre Agricultura e Segurança Alimentar, adoptada pela União Africana, em 2003. Foi assim que lançámos o Programa de Gestão Integrada da Agricultura e dos Recursos Naturais - SUSTENTA que promove a integração sócioeconómica da população moçambicana.

Senhor Presidente,

A eclosão da pandemia da COVID-19, oficialmente anunciada pela OMS em Dezembro de 2019, colheu o mundo de surpresa. Trata-se de um flagelo sanitário com elevado grau de propagação e de letalidade, com maior gravidade para os países cujas economias estão em desenvolvimento, particularmente em África.

A COVID-19 transformou a dinâmica das relações comerciais, profissionais e sociais entre os homens em todos os ambientes de convivência, nos meios urbano e rural.

Este cenário exige a mobilização de recursos financeiros adicionais para compensar a desaceleração económica, tendo em conta que o flagelo da pandemia ainda prevalece em todo o mundo e no nosso país, em particular.

Enquanto as medidas de resposta à COVID-19 continuam, aproveitamos esta oportunidade para agradecer aos parceiros bilaterais e multilaterais da comunidade internacional pelo apoio multiforme que nos permitiu prevenir e conter a propagação do novo coronavírus e embarcar para o que chamamos “novo normal”.

Excelências!

Os esforços gigantescos que temos vindo a empreender no quadro da consolidação da paz e segurança, bem como na implementação do programa de desenvolvimento sócio-económico, alinhado com a Agenda 2030, têm sido postos à prova por actos terroristas e de malfeitores, em alguns distritos da província de Cabo Delgado, e por acções armadas, de grupos alegadamente dissidentes da Renamo, em alguns pontos das províncias de Manica e Sofala, no Centro do país. Os terroristas matam, de forma hedionda as populações, provocam deslocados, destroem habitações e infra-estruturas socio-económicas, pilham bens das comunidades e mantem crianças e mulheres em cativeiro. Como consequência destes fenómenos, mais de mil pessoas foram assassinadas, e cerca de duzentos e cinquenta mil pessoas estão deslocadas para outros distritos dentro do país.

Perante as investidas terroristas, o Governo tem respondido com firmeza, por um lado, com apoio das populações locais, através das acções de defesa da soberania e integridade territorial, bem como para a protecção das populações e dos seus bens. Por outro lado, tem mobilizado apoio humanitário aos deslocados e promove actividades de desenvolvimento sócio-económico das comunidades.

Foi no quadro desses esforços que, recentemente, lançámos e operacionalizámos a Agência de Desenvolvimento Integrado do Norte (ADIN), com o objectivo de promover acções de carácter multi-sectorial, com vista ao desenvolvimento sócioeconómico integrado das províncias de Niassa, Cabo Delgado e Nampula. Cientes de que as acções terroristas de que o país é vítima têm ligações com grupos internacionais que também se envolvem no crime organizado transnacional, temos procurado abordar este fenómeno em cooperação com outros países e organizações regionais e internacionais.  

Neste âmbito, acolhemos todas as iniciativas e parcerias que concorram para complementar os esforços em curso, visando conter as acções nefastas dos terroristas no nosso país.

No quadro da implementação do Acordo de Paz e Reconciliação entre o Governo e a Renamo, estamos a implementar a descentralização governativa e o processo de Desarmamento, Desmobilização e Reintegração (DDR) de elementos armados residuais da Renamo que já abrangeu cerca de mil elementos.

Queremos aproveitar esta ocasião para manifestar o nosso reconhecimento ao papel das Nações Unidas e da comunidade internacional, sobretudo o dinamismo do Enviado Pessoal do Secretário-Geral.

Senhor Presidente, Minhas Senhoras e Meus Senhores!

Ao finalizarmos a nossa intervenção, reafirmamos a nossa firme crença de que a construção e manutenção da paz e segurança internacionais, a preservação e respeito pelos direitos humanos e a promoção do desenvolvimento sustentável, somente encontram terreno fértil para o seu florescimento, na abordagem e acção colectiva de todos os actores mundiais. Dissemo-lo com muita humildade e vontade de servir o nosso povo e de contribuir para a prosperidade da humanidade.

Queremos, com acções contribuir para o “Futuro que queremos”, moldarmos as “Nações Unidas que precisamos”, e “reafirmando, deste modo, o nosso compromisso com o multilateralismo”, na valorização do bem mais precioso do universo, a VIDA, uma VIDA de Qualidade.

Renovemos, por isso, o nosso engajamento, à escala global, na consolidação dos princípios da Carta das Nações Unidas, mantendo presente os principais destinatários destes esforços, nomeadamente “Nós os Povos”!

Feliz Aniversário às Nações Unidas!

Muito obrigado!