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São Salvador usa natureza para combater enchentes

A ONU está apoiando políticas de resiliência climática em ambientes urbanos na América Latina e no Caribe.
CityAdapt
A ONU está apoiando políticas de resiliência climática em ambientes urbanos na América Latina e no Caribe.

São Salvador usa natureza para combater enchentes

Clima e Meio Ambiente

Autoridades e produtores de café, com apoio da ONU, lançaram o projeto CityAdapt para restaurar 1.150 hectares de florestas e plantações na cidade salvadorenha; iniciativa visa melhorar a absorção de chuvas, reduzindo enchentes e deslizamentos causados pelas mudanças climáticas.

Autoridades municipais e produtores de café, com o apoio do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, Pnuma, lançaram um projeto para restaurar 1.150 hectares de florestas e plantações de café.

Com o objetivo de reavivar a capacidade de São Salvador de absorver as chuvas, o projeto CityAdapt tem como premissa um fato simples: quando a vegetação é substituída por concreto, o solo perde sua permeabilidade. 

Mulher caminha por uma estrada inundada em Santo Tomás, San Salvador, depois que a tempestade tropical Amanda causou um deslizamento de terra.
© WFP/Mauricio Martinez
Mulher caminha por uma estrada inundada em Santo Tomás, San Salvador, depois que a tempestade tropical Amanda causou um deslizamento de terra.

Efeito das mudanças climáticas

Em junho de 2020, a tempestade tropical Amanda atingiu a capital de El Salvador, São Salvador. Ventos fortes e chuvas torrenciais provocaram mais de 150 deslizamentos de terra e 20 grandes inundações, destruindo estradas, linhas elétricas e quase 30 mil casas.

O cafeicultor Hector Velasquez, cujas terras ficam nas encostas expostas do Vulcão São Salvador, com vista para a cidade, estava entre os que foram atingidos pela tempestade. Durante três dias, a chuva em sua fazenda, provocando um deslizamento de terra que destruiu uma área de cerca de 3 mil m2.

Quando Velasquez era criança, as chuvas em São Salvador eram, em sua maioria, uma garoa contínua, porém leve, que se estendia por oito meses. O solo tinha tempo para absorver a água. Mas, nos últimos anos, as mudanças climáticas tornaram as tempestades extremas mais comuns em El Salvador.

Elas são especialmente graves em torno da capital, onde a construção desenfreada e a pavimentação de estradas criaram uma barreira de concreto que impede que a chuva seja absorvida pelo solo.

As florestas são fundamentais para desenvolver a resistência climática.
CityAdapt
As florestas são fundamentais para desenvolver a resistência climática.

Plantações em risco

Em São Salvador, as enchentes e os deslizamentos de terra estão levando embora a valiosa camada superficial do solo e, com ela, a fertilidade das plantações de café. "O solo, para nós, agricultores, é a riqueza de nossa fazenda", diz Velasquez. "Se não o tivermos, não produziremos."

Antes de um declínio na produção nos últimos 10 anos, o café era vital para a economia de El Salvador, empregando cerca de 150 mil pessoas em 2012. Um relatório do International Food Policy Research Institute estima que, até 2050, a mudança climática poderá afetar o setor cafeeiro de El Salvador mais do que qualquer outro país do mundo.

Com o apoio do PNUMA, valas de infiltração foram construídas pelo projeto CityAdapt em fazendas de café em San Salvador para reduzir as inundações.
© CityAdapt
Com o apoio do PNUMA, valas de infiltração foram construídas pelo projeto CityAdapt em fazendas de café em San Salvador para reduzir as inundações.

Efeito esponja

No entanto, as árvores e outras formas de vegetação podem ser usadas como esponjas, extraindo enormes quantidades de água da terra, evitando a erosão, limitando as enchentes e recarregando os suprimentos de água subterrânea em épocas de seca.

O termo "cidade esponja" é usado para descrever uma área urbana que está criando espaços verdes para combater as enchentes. Cidades de todo o mundo, de Berlim a Wuhan, estão adotando essa estratégia inovadora. O uso de soluções baseadas na natureza para a adaptação às mudanças climáticas é conhecido como adaptação baseada em ecossistemas.

A chefe da Unidade de Adaptação às Mudanças Climáticas do Pnuma, Jessica Troni, explica que a adaptação baseada em ecossistemas é uma estratégia comprovada tanto em cidades quanto em áreas rurais. 

Ela adiciona que a agência da ONU está ajudando governos de todo o mundo a criar resiliência climática com mais de 45 projetos de adaptação baseados em ecossistemas e, no processo, mais de 113 mil hectares de ecossistemas estão sendo restaurados.

O CityAdapt, que é financiado pelo Fundo Global para o Meio Ambiente, ajudou cerca de 16 mil pessoas em São Salvador a reduzir o risco de inundações. Até a conclusão do projeto em 2022, esperava-se que esse número aumentasse para 115 mil.

A coordenadora nacional do CityAdapt em El Salvador, Leyla Zelaya, diz que 3.514 árvores frutíferas foram plantadas durante o processo de reflorestamento para fornecer recursos adicionais às comunidades locais. O projeto também está ativo em Xalapa, no México, e em Kingston, na Jamaica.

De volta à fazenda de café de Hector Velasquez, quando lhe perguntaram o que ele diria a alguém que não acredita nas mudanças climáticas, ele ri: "Temos um ditado: Não há pessoa mais cega do que aquela que não quer ver. E não há pessoa mais surda do que aquela que não quer ouvir".

*Com a reportagem do Pnuma