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Agência da ONU quer ajudar os países a medir a Cooperação Sul-Sul

Especialistas consideram essencial adquirir as capacidades nacionais para recolher dados precisos de forma consistente com o apoio de organizações
© FAO/Fanilo Randriatsizafy
Especialistas consideram essencial adquirir as capacidades nacionais para recolher dados precisos de forma consistente com o apoio de organizações

Agência da ONU quer ajudar os países a medir a Cooperação Sul-Sul

Assuntos da ONU

Unctad apresenta projeto e quadro para a coleta de dados; meta é ajudar economias a ter maior clareza do apoio ao desenvolvimento global.

Um novo projeto da Conferência da ONU para o Comércio e o Desenvolvimento, Unctad, e parceiros pretende ajudar os países em desenvolvimento a utilizar um quadro comum para medir e dar mais visibilidade à Cooperação Sul-Sul.*

A iniciativa é anunciada na sequência  do primeiro evento que reuniu representantes de 16 países da África, Ásia e América Latina em Brasília. 

Tecnologia de satélite 

Entre os participantes estiveram economistas, estatísticos e especialistas em desenvolvimento de mais de 10 organizações internacionais, incluindo Comissões Regionais da ONU.

A Cooperação Sul-Sul  junta países em desenvolvimento na partilha de recursos ou conhecimentos, competências e expertise. O modelo de parceria  é considerado “uma ferramenta poderosa que pode assumir muitas formas”.

A Índia e as Honduras atuam em conjunto para impulsionar a utilização de fontes de energia sustentáveis.
Pnud Honduras

 

Entre 2020 a 2022, o México destinou US$ 62 milhões para programas nas Honduras e em El Salvador. As iniciativas ajudaram a melhorar a segurança alimentar e a criar empregos para os jovens, beneficiando mais de 40 mil pessoas.

A Unctad aponta ainda o caso da colaboração do Brasil e da Índia na tecnologia de satélite para monitorizar a deflorestação e aumentar a produção agrícola. Outros projetos conjuntos da Colômbia e da União Africana capacitam mulheres através da aquicultura na Nigéria, na Tanzânia e na África do Sul.

Uma imagem incompleta

No evento realizado em Brasília, a especialista em políticas do Escritório das Nações Unidas para a Cooperação Sul-Sul, Sumeeta Banerji, disse que a modalidade de cooperação técnica é “essencial para se alcançar a Agenda 2030 e tornou-se particularmente evidente durante a pandemia, quando os países se uniram em solidariedade.”

Historicamente, as discussões sobre o desenvolvimento global têm-se apoiado exclusivamente em dados provenientes de cooperação que também envolve países desenvolvidos ou organizações multilaterais ou ambos.

Sem dados confiáveis sobre a Cooperação Sul-Sul, o quadro da cooperação internacional para o desenvolvimento permanece incompleto.

Em março de 2022, a Comissão de Estatística da ONU introduziu um novo indicador dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, ODS. O indicador 17.3.1 visa medir “recursos financeiros adicionais mobilizados para os países em desenvolvimento a partir de múltiplas fontes”.

Medir a cooperação Sul-Sul e fornecer dados 

A comissão também saudou um quadro comum voluntário concebido pelos países em desenvolvimento para medir a Cooperação Sul-Sul e fornecer dados para o novo indicador.

No evento, embaixadora do Brasil, Luiza Lopes, da Agência Brasileira de Cooperação, “agora temos uma estrutura que é feita pelo Sul para o Sul”.

Escola na Guiné-Bissau, apoiada pela Cooperação Sul-Sul.
Unpssc

 

 

Já a presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Ipea, do Brasil, Luciana Mendes Santos Servo, disse tratar-se de um marco histórico para a Cooperação Sul-Sul.

A Unctad é co-guardiã do novo indicador das metas globais. Nessa qualidade, a Comissão de Estatística da ONU pediu que a agência coordenasse com os países em desenvolvimento o trabalho adicional sobre o quadro, incluindo a elaboração de relatórios e o reforço de capacidades.

Mais que uma ferramenta

O quadro foi desenvolvido através de um subgrupo do Grupo Interagências e de Especialistas da ONU sobre Indicadores dos ODS. O objetivo é que o processo inclusivo e interativo reflita práticas reais do Sul global, não na configuração tradicional de países doadores e receptores, mas como parceiros iguais. 

A líder de Estatísticas da Unctad, Anu Peltola, disse que é mais do que apenas uma ferramenta de medição, mas “dá voz à esperança e à solidariedade dos países em desenvolvimento.”

Para o presidente do subgrupo que desenvolveu o quadro, Sukhbir Singh, disse que, pela primeira vez, este quadro permite aos países em desenvolvimento possam “contar a história da sua cooperação para o desenvolvimento em números e informar as políticas de Cooperação Sul-Sul com dados sólidos.”

Uma responsabilidade compartilhada

No futuro, os especialistas consideram importante que os países participantes garantam a vontade política e uma colaboração eficiente entre agências governamentais. Os dados sobre a colaboração Sul-Sul virão de muitas áreas, como a saúde, a energia, a segurança alimentar, a educação e o meio ambiente.

Comissão de Estatística da ONU pediu que a agência coordenasse com os países em desenvolvimento o trabalho adicional sobre o quadro
FAO/Hoang Dinh Nam

Além disso, os escassos recursos em muitos países em desenvolvimento significam que o apoio internacional e regional será crucial. Por isso, será essencial adquirir as capacidades nacionais para recolher dados precisos de forma consistente com o apoio de organizações especializadas, regionais e internacionais.

Peltola destaca que a jornada pela frente pode estar repleta de desafios para todos. No entanto, disse que “quando os países se unem com uma visão partilhada, podem ser alcançados resultados importantes”.

Contar a história do Sul global

Ela declarou que “agora é responsabilidade partilhada da ONU e dos países em desenvolvimento fazer com que este quadro funcione e contar a história do Sul global.”

 O Dia das Nações Unidas para a Cooperação Sul-Sul é marcado em 13 de setembro. Este ano, a data coincide com a Cúpula dos ODS vista como uma “oportunidade para destacar o papel na abordagem aos desafios globais e a necessidade de recolher mais e melhores dados”.

*Com reportagem de Gustavo Barreto, da Unctad.