Perspectiva Global Reportagens Humanas

“Em dez anos, até negacionistas serão sustentáveis”, opina ator Mateus Solano

O ator Mateus Solano é Defensor da Mares Limpos, campanha de defesa dos oceanos da ONU Meio Ambiente.

“Não há governo que se salve quando o assunto é o meio ambiente”

Divulgação
O ator Mateus Solano é Defensor da Mares Limpos, campanha de defesa dos oceanos da ONU Meio Ambiente.

“Em dez anos, até negacionistas serão sustentáveis”, opina ator Mateus Solano

Clima e Meio Ambiente

Em entrevista ao Podcast ONU News, ator brasileiro fala sobre seus temas de ativismo, inclusive a questão ambiental; além de seu engajamento em diversos temas atuais, ele protagonizou diversos personagens memoráveis da TV brasileira.

O ator e defensor da Campanha Mares Limpos do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, Pnuma, Mateus Solano, acredita que em uma década, até aqueles que não dão atenção ao clima vão precisar mudar seus hábitos. 

Ele falou à ONU News sobre as pequenas mudanças no dia a dia ter hábitos mais sustentáveis e a relevância de quebrar o tabu em outro tema que não perde a atualidade: o combate à Aids.

Acompanhe a entrevista com Mayra Lopes e Felipe de Carvalho.

“Não há governo que se salve quando assunto é meio ambiente”, defende ator Mateus Solano

ONU News: Queria começar com o tema que você fala muito nas suas redes, nas suas pautas pessoais e na sua empresa, que são os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável. As metas globais que os países têm que alcançar até 2030, mas também que as pessoas podem contribuir na sua capacidade pessoal com os seus padrões de consumo.

Que dicas você tem como uma pessoa que se envolve, que se apropriou desse tema dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável? Que dicas que você tem para as pessoas terem uma vida mais sustentável para aplicarem esse objetivo no dia a dia?

Mateus Solano: Obrigado. Legal você trazer as ODS que elas são super especiais. Eu tenho um xodó especial por elas e acho que elas são pouco divulgadas. O público que poderia e deveria se juntar em torno delas sabe muito pouco. 

Como você já falou, mais de 190 países assinaram um contrato, um compromisso com a Agenda 2030, uma série de compromissos em torno de todas as questões que são importantes na sociedade. Todas têm a ver umas com as outras. Você não tem igualdade de gênero se não tem ligação com a indústria. De alguma forma estão interligadas e são pontos de encontro. Eu acho que as ODS são pontos de encontro de todo mundo. 

Por exemplo se você quer lutar pela vida na Terra, então sua ODS é a número 15. Através do site da ONU, você pode se informar e conhecer outras pessoas que também estão nessa luta. Então, eu acho que elas super especiais.

No dia a dia, eu acho que aqueles “Rs” são fundamentais. A reciclagem, reutilizar e repensar o nosso consumo e o que a gente precisa realmente: o que a gente está consumindo é necessidade ou é algum buraco que eles inventaram que a gente pode tapar comprando? E de que empresa que eu compro? Elas se importam ou não se importam? Além disso, fugir dos plásticos, fugir para ontem do plástico descartável e adotar coisas simples no dia a dia, como uma garrafa d'água ou uma sacola retornável. 

Eu costumo dizer que um gesto muda, quando você realmente fala: “eu vou reservar um tempo espaço, um pensamento para o meio ambiente no meu dia a dia”, isso já vai ser uma bola de neve do bem. A partir desse pensamento, outras coisas, outros insights, vão vir naturalmente.

A gente é feito para ser da natureza, mas a gente se convenceu de que não é dela, que ela é um recurso para a gente explorar. Acho que está no cerne de quem somos. A sustentabilidade é sermos seres sustentáveis.

A Amazônia Legal envolve nove estados brasileiros, que concentram cerca de 60% da Floresta Amazônica
Antonio Cruz/Agência Brasil
A Amazônia Legal envolve nove estados brasileiros, que concentram cerca de 60% da Floresta Amazônica

ONU News: Você é muito vocal, com diversos assuntos atuais, mas também diversos assuntos e às vezes temas polêmicos. Queria saber como que você navega nas redes sociais, nas reações que você recebe sobre as opiniões que você emite.

Mateus Solano: Eu não sou uma pessoa muito polêmica. Não sei se eu tenho esse cuidado. É claro que no momento de tensão política, por exemplo, acaba que você escolhe um lado e isso vai trazer facas e pedras do outro. 

A gente está vivendo um momento muito perigoso, um momento muito ofensivo, muito pouco participativo, colaborativo, em que a sociedade não quer se pensar junta, unida.

Mas fora isso, eu não sou um cara de grandes polêmicas, não. Inclusive, eu acho que essa pauta que eu abraço da sustentabilidade, eu acho que é quase uma unanimidade até entre os negacionistas.

ONU News: Um momento marcante da sua carreira, sem dúvida, foi quando você protagonizou o primeiro beijo gay da TV brasileira. E é claro que junto com isso, vieram uma série de discussões importantes sobre luta contra o preconceito, contra a discriminação. Na sua avaliação, desde aquela época até hoje, o Brasil avançou ou retrocedeu na luta contra o preconceito e a discriminação?

Mateus Solano: Olha, eu acho que não existe outra direção senão a direção do avanço, né? Por mais que possa parecer que a gente regrediu, isso faz parte do avanço, né? Quer dizer, a história anda em tropeços, em soluços, em vais e vens e repetições de si própria. A gente repete padrões que a gente aprendeu lá na infância e de repente se vê preso numa coisa que a gente já podia estar livres há muito tempo. Eu acho que a humanidade também anda assim muito em passos de formiga. 

Então, por mais que pareça que realmente a gente está vivendo um momento de muito conservadorismo em relação a novas ideias ou em relação mesmo a igualdade, ao respeito ao próximo, eu acho que isso tudo é uma reação ao novo que vem e que como diz aquela música, né, “o novo sempre vem”.

Soundcloud

ONU News: A gente viu que durante a pandemia também retrocedeu no avanço do acesso ao tratamento da AIDS. Além do Brasil, você já chegou a atuar em algum outro país de língua portuguesa falando sobre esse assunto, como Angola, Moçambique, que a gente sabe que também tem um desafio com AIDS.

Mateus Solano: Infelizmente não, gostaria muito de ir a Cabo Verde, Angola, Moçambique, além de Portugal, outros países que, graças à colonização portuguesa, também falam português. 

Em Portugal eu tive a oportunidade de representar Unaids e foi muito bacana poder usar a minha imagem para falar de um assunto que acaba sendo tabu mesmo entre as pessoas que está falando sobre isso, os mais interessados, digamos assim.

Eu tive um amigo que enquanto eu estava sendo chamado para ser a embaixador do Unaids, faleceu. Porque não foi procurar, ficou envergonhado ou caiu em depressão e não procurou ajuda. Então, [é bacana] fazer parte de um movimento que vai conscientizar as pessoas para procurarem ajuda, porque ninguém precisa sofrer como se sofria e nem morrer como se morria por doenças decorrentes do HIV.

A organização foi uma das cinco ONGs contempladas com recursos do edital Fast-track Cities, lançado pelo Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS Unaids.
Public Health Alliance/Ukraine

ONU News: Durante a sua atuação com HIV no Brasil, que mensagens que você acha que poderiam também ter um impacto nesses países lusófonos que tem uma prevalência alta e falta de financiamento? Além disso, o que você diria para esses financiadores que estão abandonando o tema?

Mateus Solano: Há que se dar visibilidade realmente ao tema. Eu acho que o grande vilão disso tudo é justamente essa vergonha de se falar sobre o assunto. Esse assunto ficar velado. Principalmente, como eu disse, entre os mais os maiores interessados, as pessoas que contraíram ou estão num grupo de risco, próximo a pessoas que contraíram o vírus. E essas pessoas não querem falar ou querem procurar, não querem saber... E aí eu acho que isso acaba criando uma falsa impressão de que o problema não existe. 

Primeiro, quem sabe que que contraiu o vírus, ou que conhece pessoas, pode se informar e pode espalhar essa informação. Quanto mais pessoas souberem a informação correta sobre o tratamento e sobre a importância inclusive dessas empresas, melhor. E  mais a gente vai também falar alto para que essas empresas não saiam de fininho. Realmente é fundamental que se haja o financiamento da política de combate ao HIV, em todo mundo.

ONU News: A gente queria escutar de você sobre a questão da pauta ambiental, especialmente no Brasil, você vê que nesses últimos anos teve um avanço ou até como você gostaria que esse avanço fosse. Para você, como o Brasil deveria atuar na pauta ambiental? O que você espera do nosso país?

Mateus Solano: Nossa, é muita coisa nessa sua reflexão, né? Então, o Brasil tem um papel fundamental no futuro, né? Não só por ter a Amazônia, por ter seis biomas riquíssimos. Então era realmente ser um país que está lá na frente, mas é um país colonizado, é um país que diz amém a quem paga mais. Eu acho que o Brasil anda se repensando e o mundo todo, com acesso à internet, anda se mexendo, se entendendo seu poder. Mas voltando aquela história do avanço que eu já falei e estamos sempre avançando e pode ser com passos de formiga, pode ser aos soluços, mas estamos avançando. A questão da sustentabilidade ainda mais. A questão é que o ser humano, ele só avança, só dá um passo quando está com a água no pescoço. E na questão ambiental, está com a água no pescoço e é muito triste. 

Eu tenho uma reflexão do André Trigueiro, que é muito forte, mas que vale a pena. O neto de um nazista hoje se senta no colo do avô, ou de um cidadão que fechou os olhos naquela época, e pergunta “como vocês puderam”? Eu acho que os nossos netos vão ter total direito de se sentar no nosso colo e perguntar por é que a gente não fez nada.

Quando vem uma garota com a Greta [Thunberg], a gente se assusta com aquela potência toda, mas é porque é como se tivesse tudo reunido nela, como se ninguém pareça se importar. Eu acho inacreditável aquela menina. Mas então, é uma questão muito urgente, a gente é educado não prestar atenção nela. 

Por outro lado, a gente, como eu disse, só tem uma direção: o avanço. E daqui dez anos até a pessoa mais negacionista vai ser mais sustentável, porque não tem outro jeito. 

Se a gente quiser continuar bebendo água, respirando ar puro, não tem outro jeito. Para sobreviver às catástrofes ambientais, a gente precisa mudar, não tem outro jeito. E, infelizmente, o nosso “deus mercado” é o único que pode fazer alguma coisa.

ONU News: O Brasil recém sediou a Cúpula da Amazônia e em breve vai sediar a COP 30. Você acha que o país está realmente com uma visão que vai contribuir com essa causa global? Como é que você avalia a expectativa para o Brasil em relação a esses grandes eventos internacionais que vão acontecer?

Mateus Solano: Eu quero acreditar que sim, quero acreditar que a gente está com um outro approach, com o que é nosso e com o que é internacional, que a gente tem relação internacional também, né? Com a Marina [Silva] à frente do Ministério e agora tivemos uma redução, finalmente, de níveis drásticos de desmatamento. Mas tem muito a ser feito, né? 

Essa coisa de botar petróleo na Amazônia é realmente um contrassenso. E assim como foi contrassenso Belo Monte. Eu acho que não há governo que se salva quando o assunto é o meio ambiente. Não há. Nunca houve nenhum governo que fosse realmente desse a importância que o assunto tem sem se curvar ao mercado, a isso que a gente inventou e que a gente bota nossa vida a serviço. Quando na verdade a nossa vida depende de ar, de água, de biodiversidade, de sustentabilidade. A gente vive num torpor que eu quero crer que a gente está se chacoalhando para sair dele.

Autoridades brasileiras destacam potencial de aumento de empregos e da autossustentabilidade das populações locais
Marcelo Camargo/Agência Brasil
Autoridades brasileiras destacam potencial de aumento de empregos e da autossustentabilidade das populações locais

ONU News: A gente está chegando no final da nossa entrevista, mas antes a gente queria saber onde a gente vai encontrar o Mateus nos próximos meses, além das suas redes sociais, onde mais a gente pode te acompanhar?

Mateus Solano: Bom, eu estou voltando para uma novela, que é um remake de uma novela. Eu já era vivo, mas era muito pequeno, que é “Elas por elas”. Infelizmente perdemos a grande Aracy Balabanian, que era uma estrela dessa novela na versão de 82. Agora volta com Isabel Teixeira nesse papel e eu tenho a honra de contracenar com um elenco incrível, como Lázaro Ramos fazendo o Mário Fofoca. No final de setembro estamos no ar.

Eu estou sempre pensando em novos projetos, colocando a sustentabilidade no meio. Daí, hoje fico muito feliz também de ser pensado não só como ator talentoso, mas também como um defensor do meio ambiente. E que nós possamos nos escutar e mudar. Mudar para preservar a vida.

ONU News: Obrigada! A gente espera conversar com você de novo em breve, no futuro, para ter mais atualizações sobre a sua luta pelo meio ambiente e sobre outros tantos assuntos importantes.