Perspectiva Global Reportagens Humanas

Especialistas da ONU pedem fim imediato de detenções de afegãs

Meninas caminham pela estrada em um bairro hazara no Afeganistão
Unicef/Roger LeMoyne
Meninas caminham pela estrada em um bairro hazara no Afeganistão

Especialistas da ONU pedem fim imediato de detenções de afegãs

Mulheres

Operações do Talibã em locais públicos, incluindo centros comerciais, escolas e mercados resultaram na detenção arbitrária de diversas mulheres e meninas em janeiro; as acusações são de suposta violação do código de vestimenta instituído no país; relatores falam de “sistema institucionalizado de discriminação”.

Especialistas* da ONU expressaram nesta sexta-feira profunda preocupação com relatos de que dezenas de mulheres e meninas no Afeganistão foram detidas arbitrariamente e sujeitas a maus-tratos desde o início de janeiro por supostamente violarem o código de vestimenta do Talibã.

Os especialistas pediram o fim de “toda a privação arbitrária de liberdade” e a “libertação imediata de todas as mulheres e meninas que ainda possam estar detidas”.

Mulheres e meninas levadas à força em locais públicos

No comunicado, o grupo apelou às autoridades de facto para que cumpram as obrigações internacionais do Afeganistão em matéria de direitos humanos, especialmente ao abrigo da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres.

As operações do Talibã começaram inicialmente no oeste de Cabul, mas rapidamente se espalharam para outras partes da cidade. As prisões e detenções foram feitas em locais públicos, incluindo centros comerciais, escolas e mercados de rua.

Mulheres e meninas foram levadas à força para veículos da polícia e acusadas de usar um “hijab ruim”. Elas foram mantidas incomunicáveis, com os talibãs alegando que elas usavam roupas coloridas e justas, contrariando as regras instituídas. 

Em maio de 2022, o regime do país ordenou a todas as mulheres que observassem o “hijab adequado”, de preferência usando em público um chadari, uma roupa preta larga que cobre o corpo e o rosto. A ordem também responsabilizava os familiares do sexo masculino pela aplicação da proibição ou seriam punidos.

A ONU afirma que as mulheres e as meninas têm sido progressivamente excluídas da vida pública no Afeganistão
Ocha/Charlotte Cans
A ONU afirma que as mulheres e as meninas têm sido progressivamente excluídas da vida pública no Afeganistão

Redução da participação feminina na sociedade

Os relatores de direitos humanos da ONU afirmaram que “mulheres e meninas foram supostamente mantidas em espaços superlotados em delegacias de polícia, recebendo apenas uma refeição por dia, sendo algumas delas submetidas a violência física, ameaças e intimidação”. 

Além disso “não lhes foi proporcionada representação legal e acesso à justiça ou reparação”, adicionaram.

A libertação das detidas depende de membros masculinos da família e dos anciãos da comunidade darem garantias, muitas vezes por escrito, de que cumprirão o código de vestimenta prescrito.

Para os especialistas, o episódio “perpetua um sistema institucionalizado de discriminação e controle de mulheres e meninas e diminui ainda mais o seu lugar na sociedade”.

Restrições crescentes à educação

Devido à falta de transparência e de acesso à justiça, não se sabe quantas ainda estão detidas, talvez incomunicáveis.

De acordo com a ONU, a situação das mulheres e das meninas deteriorou-se imensamente desde que os talibãs tomaram o poder em agosto de 2021, com restrições crescentes à educação, emprego, expressão, associação, privacidade, movimento e participação na vida pública. 

A situação humanitária no Afeganistão é marcada por aumento do risco da fome. O Programa Mundial de Alimentos, PMA, planeja alcançar quase 630 mil pessoas em insegurança alimentar e tratar mais de 42 mil mães e crianças grávidas e lactantes desnutridas, com apoio recebido do Japão.

O país deu uma contribuição de US$ 13,5 milhões assistência alimentar e nutricional de emergência. 

O recurso permitirá que quase 36 mil crianças em idade escolar na escola primária recebam biscoitos fortificados como lanches escolares diários para ajudá-los a se manterem saudáveis e aprender melhor.

O diretor nacional do PMA no Afeganistão, Hsiao-Wei Lee, disse que "esta contribuição chega em um momento crítico para as muitas famílias em todo o país que estão menos preparadas do que nunca para enfrentar o rigoroso inverno afegão, quando a fome atinge mais fortemente".

* Os relatores de direitos humanos são independentes das Nações Unidas e não recebem salário pelo seu trabalho.