Perspectiva Global Reportagens Humanas

Comitê da ONU pede retratação de Portugal por escravidão

Reprodução do livro Escravidão na Era da Memória
Reprodução da capa
Reprodução do livro Escravidão na Era da Memória

Comitê da ONU pede retratação de Portugal por escravidão

Direitos humanos

Comissão avalia países sobre políticas para a eliminação da discriminação racial; conclusões incluem a formulação de leis para lidar com consequências do legado do colonialismo; avaliação sobre a Rússia destaca discurso de ódio contra ucranianos.

O Comitê da ONU para a Eliminação da Discriminação Racial, Cerd, divulgou nesta sexta-feira conclusões sobre Argentina, Níger, Filipinas, Portugal, Rússia e Tadjiquistão, após revisão em sua última sessão.

As conclusões contêm as principais preocupações e recomendações do Comitê sobre a implementação da Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, bem como pontos em que as nações avançaram nesta questão.

Portugal

O comitê avaliou que Portugal deve considerar pedir desculpas por seu papel no comércio transatlântico de escravos e práticas de escravidão em suas ex-colônias.

Além disso, a recomendação inclui adotar legislação específica para lidar com as consequências duradouras dessas práticas, fornecer reparações por atrocidades graves e massivas cometidas e garantias de não-repetição.

"Memória da Escravidão" exibido no Projeto Rota do Escravo da Unesco em Paris.
UNESCO/P. Chiang-Joo
"Memória da Escravidão" exibido no Projeto Rota do Escravo da Unesco em Paris.

Legados do colonialismo

O comité também destacou os legados remanescentes do colonialismo, do comércio transatlântico de escravos e da escravidão continuarem a alimentar racismo, intolerância, estereótipos raciais e discriminação em Portugal.

Segundo os especialistas, isso impede grupos étnicos ou raciais minoritários, em particular, africanos e afrodescendentes, exerçam todos os direitos humanos e liberdades fundamentais.

Retratação

O comitê expressou preocupação com relatórios indicando que africanos e afrodescendentes são vítimas de racismo e discriminação múltiplos, particularmente em áreas como participação política, acesso a emprego, moradia, saúde, educação, previdência social e local de trabalho.

Uma das recomendações é que Portugal crie e implemente medidas e políticas especiais para continuar a melhorar as condições de vida, participação e representação política, bem como a situação socioeconômica dos africanos e afrodescendentes.

Argentina

As conclusões sobre a Argentina também foram publicadas ontem e incluem preocupação sobre violência policial, que afeta principalmente povos indígenas, afrodescendentes e migrantes

O comitê recomendou que o país tomasse medidas para prevenir violência policial e adotasse leis para proibir explicitamente a discriminação racial.

Em relação aos povos indígenas, os especialistas citam a falta de legislação para garantir efetivamente as terras comunitárias tradicionalmente ocupadas por eles e com os despejos em andamento.

Também foram destacados os supostos abusos e violências sexuais contra mulheres e meninas indígenas, especialmente no norte do país, como o caso das mulheres e meninas Wichi em Salta.

Sergey Sizonenko, membro da Associação dos Povos Indígenas do Norte, Sibéria e Extremo Oriente.
Sergey Sizonenko
Sergey Sizonenko, membro da Associação dos Povos Indígenas do Norte, Sibéria e Extremo Oriente.

Rússia

Sobre a situação da Rússia, o comitê destacou as graves violações dos direitos humanos cometidas durante o atual conflito armado com a Ucrânia.

Também foi apontado relatos de incitação ao ódio racial e propagação de estereótipos racistas contra grupos étnicos ucranianos, mobilização forçada e recrutamento, que afetaram desproporcionalmente as minorias étnicas, incluindo os povos indígenas.

A recomendação é que a Rússia cesse imediatamente a mobilização forçada e o recrutamento tanto em suas fronteiras quanto em outros territórios sob seu controle. Também insta a monitorar e combater o discurso de ódio racista e a discriminação.

O comitê também mostrou preocupação sobre a definição de “atividade extremista”, que pode colocar em risco o exercício legítimo dos direitos à liberdade de expressão e associação e ser aplicada contra operações e atividades de organizações da sociedade civil, jornalistas e defensores dos direitos humanos.