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Chefe da ONU decepcionado com falta de consenso sobre tratado nuclear BR

Manifestantes pedem a proibição de armas nucleares
ICAN/Tim Wright
Manifestantes pedem a proibição de armas nucleares

Chefe da ONU decepcionado com falta de consenso sobre tratado nuclear

Paz e segurança

10ª Conferência de Revisão das Partes do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares foi finalizada nesta sexta-feira na sede das Nações Unidas em Nova Iorque; documento final teve oposição da delegação russa sobre ocupação de instalações nucleares na Ucrânia.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, expressou sua decepção com a falta de consenso na 10ª Conferência de Revisão das Partes do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares, finalizada nesta sexta-feira na sede das Nações Unidas em Nova Iorque.

Em nota emitida pelo seu porta-voz neste sábado, o chefe da ONU lamentou não ter sido capaz de enfrentar os desafios prementes que estão ameaçando a segurança coletiva mundial. 

Teste nuclear realizado em uma ilha na Polinésia Francesa em 1971.
Foto: Ctbto.
Teste nuclear realizado em uma ilha na Polinésia Francesa em 1971.

Documento final

O evento não gerou um documento final mesmo após quatro semanas de intensas discussões. A Rússia se opôs a partes ao texto, que citava preocupação sobre o controle das instalações nucleares ucranianas. Atualmente, tropas russas seguem ocupando a usina nuclear de Zaporizhzhia.

No entanto, o chefe da ONU elogiou o engajamento sincero e significativo das partes e o reconhecimento do Tratado de Não Proliferação como a “pedra angular” do regime global de desarmamento.

Segundo seu porta-voz, Stéphane Dujarric, o conturbado ambiente internacional e o risco elevado de uso de armas nucleares, por acidente ou por erro de cálculo, exigem ações urgentes e resolutas. 

Ele adicionou que o secretário-geral da ONU pede aos Estados que usem todas as vias de diálogo, diplomacia e negociação para aliviar as tensões, reduzir o risco e eliminar a ameaça nuclear “de uma vez por todas”.

Segundo Dujarric, um mundo livre de armas nucleares continua sendo a maior prioridade de desarmamento das Nações Unidas e um objetivo com o qual o secretário-geral continua firmemente comprometido.

Demora e frustração

O Tratado de Não Proliferação, que entrou em vigor em março de 1970, é o único compromisso vinculante com o objetivo de desarmamento dos Estados que oficialmente possuem armas nucleares. Ele está organizado em torno de três pilares – desarmamento, não proliferação e uso pacífico da energia nuclear – e 191 países aderiram ao Tratado.

As conferências de revisão são realizadas a cada cinco anos. A sessão de 2015 também terminou sem um documento final, enquanto a Conferência de 2020 foi adiada devido à pandemia de Covid-19.

O embaixador argentino Gustavo Zlauvinen, que também é presidente da Conferência de Revisão, disse a jornalistas que estava “frustrado” com a falta de consenso na adoção de um documento final.
Impactos da guerra na Ucrânia

Zlauvinen avaliou que as perspectivas de um texto final eram "muito escassas" mesmo antes do início dos debates, já que existem opiniões divergentes sobre questões como garantias de segurança.

Para ele, a invasão da Ucrânia pela Rússia em fevereiro aumentou essas tensões. O presidente da sessão afirmou que era esperado que a guerra lançaria “uma sombra sobre a Conferência de Revisão”.

Gustavo Zlauvinen explicou que a última reunião plenária foi adiada e posteriormente suspensa por várias horas devido a negociações finais, particularmente com a delegação russa.

Segundo ele, os representantes da Rússia explicaram que não concordariam com o texto “a menos que mudanças muito importantes fossem adicionadas sobre a situação das instalações nucleares ucranianas sob controle russo”.

Ainda assim, Gustavo Zlauvinen avalia que a Conferência de Revisão foi “significativa”. As delegações se envolveram em discussões sobre questões muito complexas, e a falta de um documento final não diminuiu seu trabalho.

Em viagem pela Ásia, o secretário-geral da ONU, António Guterres, condenou aumento das tensões entre nações que possuem armas nucleares.
UN Mongolia/Rentsendorj Bazarsuk
Em viagem pela Ásia, o secretário-geral da ONU, António Guterres, condenou aumento das tensões entre nações que possuem armas nucleares.

Esforços redobrados

A alto representante da ONU para Assuntos de Desarmamento, Izumi Nakamitsu, também se dirigiu a repórteres. Como o secretário-geral, ela ficou desapontada com o resultado.

Ela afirmou que embora a proposta final não fosse um “documento perfeito”, a maioria dos Estados Partes sentiu que seria um acordo de interesse para comunidade internacional.

Para a alta representante, o desafio agora é garantir que os avanços conquistados marquem o próximo ponto de partida e que os esforços para o desarmamento nuclear sejam revigorados.

Nakamitsu avaliou que mesmo que a Conferência não tenha obtido resultados consensuais pela segunda vez consecutiva, o Tratado de Não Proliferação “não entrará em colapso ou sofrerá danos imediatos”.

No entanto, ela afirma que é necessário reverter o sentimento de frustração e a falta de confiança no acordo. Segundo a representante, para que isso aconteça, é preciso que haja compromissos sérios e substantivos entre “Estados com armas nucleares e Estados sem armas nucleares e, também, entre os próprios Estados com armas nucleares.”