ONU realiza debate sobre dignidade menstrual como direito humano e remoção de tabus
Pelo menos 500 milhões de meninas e mulheres não conseguem ter períodos seguros e higiênicos por falta de apoio e recursos; ONG Wash United diz que situação causa constrangimento e é um tema de direitos humanos.
Em todas as regiões do mundo, ativistas feministas jovens têm liderado campanhas, inclusive nas redes sociais, para desafiar um sistema de tabus, desigualdade de gênero e de falta de dignidade menstrual. A declaração é da alta comissária de Direitos Humanos, Michelle Bachelet.
Segundo a ONU, falta apoio a pelo menos 500 milhões de meninas e mulheres para que tenham períodos higiênicos e seguros. Geralmente por não poderem comprar absorventes.
Experiências das mulheres diferem com base em classe social, raça
Bachelet discursou num painel de alto nível sobre o tema durante a 50ª. sessão do Conselho de Direitos Humanos em Genebra, na Suíça.
Na discussão, os participantes destacaram os desafios e as melhores maneiras de soarem o alarme sobre o problema. O grupo quer ampliar a discussão para o gerenciamento da dignidade menstrual como um direito humano.
Michelle Bachelet lembra que a experiência das mulheres com o ciclo menstrual não é homogênea, mas difere com base em fatores como idade, gênero, raça, deficiência, razões econômicas, sociais, migração e outros status e contextos. Sejam eles nas áreas de paz, conflito, desastre ou como parte de uma crise de saúde.
“Menstruação é bênção e maldição”
Uma das cofundadoras do coletivo feminista Jeyetna, Vanessa Zammar, afirmou que menstruar é “uma bênção e uma maldição” ao mesmo tempo. O coletivo fornece informação, produtos e um espaço de diálogo para mulheres que sofrem de pobreza menstrual no Líbano.
Ela lembra que o período limpa o sistema orgânico, mas é algo caro para muitos que não podem pagar pelos altos preços dos produtos.
Coisas que podem ser simples para alguns: um acesso a um banheiro limpo e privado, ter um lugar seguro e a uma pessoa de confiança não é privilégio de todos. E falta de informação e brechas no conhecimento sobre menstruação ocorrem por não ter o financiamento para pesquisa.
Uma das culturas no Líbano: Chegou a menarca, já pode se casar.
Vanessa Zamar contou ter conhecido muitas mulheres e meninas nos eventos do coletivo do Líbano que tiveram vergonha e medo quando menstruaram pela primeira vez, a chamada menarca.
Por exemplo, uma menina de 12 anos teve medo de contar para os pais por que na cultura dela quando uma menina começa a menstruar, ela já está pronta para se casar.
Um dos fundadores e o presidente da ONG Wash United, Thorsten Kiefer, acredita que para acabar com o estigma da menstruação, as meninas mais novas precisam ter acesso à informação.
Ele citou a história de Khushi, uma menina do norte da Índia que estava a caminho da escola quando notou o sangue entre as pernas. Ela pensou que estivesse com câncer e perto da morte.
Somente ao chegar em casa, a mãe foi esclarecer o motivo do sangramento e disse a ela que não era a morte, mas que ela tinha se tornado uma mulher.
Homens devem ser aliados para descontruir preconceito
Kiefer afirma que a falta de informação e educação sobre o período e de acesso a produtos leva milhões de meninas a não ter ideia do que acontece com elas e como tratar disso de uma maneira segura e higiênica.
Para ele, os homens têm participação na manutenção do tabu e o estigma sobre o tema durante séculos. E por isso, é hora deles ajudarem a acabar com esses preconceitos sendo aliados das mulheres para superar o desafio.
Já a pediatra Natalia Kanem que é diretora-executiva do Fundo das Nações Unidas para a População, Unfpa, explica que embora a menstruação seja um processo biológico normal para a maioria das mulheres e meninas, ela permanece sendo alvo de discriminação e humilhação.
Casamento infantil, gravidez indesejada, evasão escolar
Por causa dos tabus e estereótipos que estigmatizam o período como sujo, muitas pessoas veem a menstruação com vergonha e não têm acesso a recursos para ter o período de forma saudável e segura.
Segundo Natalia Kanem, esta á uma situação de saúde pública e um tema de desenvolvimento.
A menarca, ou primeira menstruação de uma menina, pode causar várias violações de direitos humanos incluindo casamento infantil, violência sexual e gravidez indesejada na adolescência.
E, claro, a interrupção ou o fim da educação escolar.
Conflitos, deslocamentos internos, mulheres apátridas
A presidente do Grupo de Trabalho da ONU sobre discriminação contra mulheres e meninas, Melissa Upreti, disse que o grupo está preocupado com meninas e mulheres em zonas de conflitos, que vivem como refugiadas ou em deslocamentos internos, e até mulheres apátridas que encontram dificuldades todo mês por não terem o mínimo necessário.
Ela também citou o impacto da pobreza em países de baixa renda.
Durante a discussão, em Genebra, a alta comissária de Direitos Humanos, Michelle Bachelet, disse ser vital pra legisladores e o pessoal da área de saúde criarem uma abordagem multisetorial para discutir a saúde menstrual ancorada nos direitos humanos.
Para ela, essa ação exigirá dos Estados implementar uma série de obrigações do direito internacional incluindo responder ao estigma, a estereótipos danosos e a norma sociais de discriminação baseada em gênero.
Mulheres precisam de informação para fazer escolhas
Todos são passos que influenciam a experiência de mulheres e meninas sobre o tema.
Ela também ressaltou a necessidade de preparar o ambiente onde meninas e mulheres podem se informar e fazer escolhas sobre suas vidas, seus corpos incluindo a saúde menstrual sem estigma, violência e discriminação.
Os demais palestrantes do painel de alto nível foram unânimes em dizer que é a responsabilidade dos países assegurar que os direitos à saúde sexual e reprodutiva serão respeitados.
E nesse campo, a voz das mulheres e meninas precisa ser ouvida porque é delas que se trata.