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Situação humanitária em Mariupol é grave e crimes devem ser investigados, afirma Bachelet BR

Texto a ser apreciado pelo Conselho de Direitos Humanos pede que Rússia informe quem foi transferido
Ocha/Kateryna Klochko
Texto a ser apreciado pelo Conselho de Direitos Humanos pede que Rússia informe quem foi transferido

Situação humanitária em Mariupol é grave e crimes devem ser investigados, afirma Bachelet

Direitos humanos

Alta comissária de direitos humanos da ONU afirma que 90% dos prédios residenciais foram destruídos; discurso aponta haver civis privados de liberdade de sair e entrar na cidade; Michelle Bachelet fala de “processo de filtragem”, que pode ser equivalente a maus-tratos; chefe de direitos humanos pede julgamento justo aos prisioneiros de guerra e acesso completo para investigações.

A alta comissária de direitos humanos da ONU, Michele Bachelet, falou sobre a situação humanitária em Mariupol, na Ucrânia, durante a 50ª sessão do Conselho de Direitos Humanos, nesta quinta-feira, em Genebra.

Ela alertou que a destruição na cidade deixa civis em situação de extrema vulnerabilidade e que ações das tropas russas podem indicar violações do direito internacional e crimes de guerra.

Civis de Mariupol deixam localidade em operação liderada por ONU e Cruz Vermelha.
Foto: © UNOCHA/Kateryna Klochko
Civis de Mariupol deixam localidade em operação liderada por ONU e Cruz Vermelha.

Drama de civis

Segundo os dados apresentados por Bachelet, a cidade teve 90% dos prédios residenciais destruídos ou danificados e 350 mil pessoas foram forçadas a deixar a área.

A chefe dos direitos humanos ressaltou que Mariupol foi o lugar mais ‘mortal’ do país entre fevereiro e abril. O local testemunhou cenas dramáticas do conflito, como a evacuação de mais de 600 pessoas de Azovstal e o ataque aéreo russo ao teatro, onde centenas de civis se abrigavam, incluindo crianças.

Até o momento, o escritório da ONU verificou a morte de 1348 civis, sendo que 70 vítimas eram crianças. Bachelet afirma que as mortes foram causadas por ataques aéreos, bombardeios, bem como disputas nas ruas e tanques de combates.

Ela alerta que o número de mortes pode ser muito maior e que ainda há corpos para serem enterrados ou mesmo descobertos em lugares sem acesso. Segundo Bachelet, até que todas as vítimas sejam encontradas e identificadas, é impossível saber o número real de mortes civis.

Os ataques em Mariupol também danificaram hospitais e deixaram as instalações sem eletricidade e mantimentos, ficando incapazes de receber pacientes. 

A alta comissária destacou que a falta de gás e água deixou outros civis, especialmente pessoas idosas ou com deficiências, em situações de total vulnerabilidade.

Brasileiro porta-voz do Ocha descreve mais uma etapa de evacuação de civis em Mariupol.

Militares e crimes de guerra

Segundo Bachelet, mais de 2 mil soldados ucranianos foram levados como prisioneiros de guerra de Mariupol desde o início de março. Ela relatou que seu escritório recebeu denúncias do assassinato de um soldado ucraniano fora de combate e de maus-tratos a vários outros. 

Ela explicou que, sem acesso a prisioneiros de guerra em território controlado pelas forças armadas russas e grupos armados afiliados, seu escritório não pôde avaliar as condições de detenção e tratamento.

A alta comissária adicionou que também está atenta aos supostos julgamentos de três militares ucranianos, cidadãos de outros países, que foram feitos prisioneiros de guerra em Mariupol. 

Eles foram condenados por tentativa de tomada de poder em território controlado por grupos armados afiliados à Rússia em Donetsk, treinamento para atividades terroristas e mercenarismo, e condenados à morte. 

Bachelet ressaltou ter preocupações de que as garantias de um julgamento justo não foram cumpridas, incluindo que os réus nos casos não puderam apresentar uma defesa completa.

Ela lembra que a privação do direito dos prisioneiros de guerra a um julgamento justo e regular é proibida pelo direito internacional e pode constituir crime de guerra.

Riscos e violação de direitos humanos

Mesmo com o fim dos bombardeios em Mariupol, Bachelet afirma que a situação segue delicada: é uma cidade destruída e esgotada, com seus moradores restantes lutando diariamente com acesso limitado a serviços básicos e serviços sociais, como assistência médica. 

Assim, ela destacou que começaram relatos de doenças infecciosas, incluindo cólera. Muitas pessoas não têm mais onde morar ou vivem em apartamentos danificados e dependem da ajuda humanitária.

Um ponto de atenção é sobre a impossibilidade de trânsito livre para dentro e fora da cidade e sobre o chamado “processo de filtragem” de civis. Ela afirma que podem estar acontecendo determinações arbitrárias, intimidação e humilhação, que podem equivaler a maus-tratos.

Para Bachelet, a remoção dos restos explosivos de guerra da cidade e a recuperação, identificação e enterro digno de todos os restos mortais devem ser priorizados imediatamente. 

Ela afirmou que a Rússia deve cumprir todas as suas obrigações sob a lei internacional “aplicável como potência ocupante” em Mariupol.

Além disso, a chefe de direitos humanos explicou que para garantir que o monitoramento seja independente e imparcial, as equipes especializadas devem ter acesso completo e desimpedido a Mariupol e todas as outras áreas afetadas na Ucrânia, bem como acesso efetivo a informações relevantes.