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Nataliia Vladimirova e a filha de 4 anos, Sasha, estão em Lisboa desde 14 de março.

Professora ucraniana refugiada diz à ONU News que teme nunca mais ver o marido BR

Foto: UN News/Leda Letra.
Nataliia Vladimirova e a filha de 4 anos, Sasha, estão em Lisboa desde 14 de março.

Professora ucraniana refugiada diz à ONU News que teme nunca mais ver o marido

Ajuda humanitária

Natasha, 33 anos, dava aulas em Universidades e fazia auditoria; no dia da invasão russa, ela, o marido e a filha de 4 anos saíram de casa esperando retornar em breve; não acreditavam que a guerra poderia ocorrer; um mês depois, parte da família se refugia em Portugal, mas o marido teve que ficar e lutar pela Ucrânia. 

24 de fevereiro: era uma típica quinta-feira de Inverno em Kharkiv, no leste da Ucrânia. Nataliia Vladimirova estava dormindo quando foi acordada pelo marido. 

O parceiro a avisa que os ataques da Rússia haviam começado. Naquele momento, a ex-professora universitária e auditora sequer sabe o que colocar nas malas. A família de Nataliia, que prefere ser chamada de Natasha, não tem a menor ideia de quanto tempo o conflito irá durar. Sua preocupação inicial foi em levar o maior número possível de documentos e roupas para a filha Oleksandra, de apenas quatro anos.

Fuga repentina 

A família vivia feliz em Kharkiv até a guerra começar. Deixaram a cidade em 24 de fevereiro.
Foto: Arquivo pessoal de Nataliia Vladimirova.
A família vivia feliz em Kharkiv até a guerra começar. Deixaram a cidade em 24 de fevereiro.

 

Naquele mesmo dia, a família abandona o apartamento em Kharkiv – o marido tinha apenas a roupa do corpo, um traje esportivo. 

Dúvidas e ceticismo permeavam as conversas de Natasha com o marido antes do ataque russo: ela havia até sugerido ao marido que comprassem passagens de avião para fugirem, antes mesmo da guerra. Mas ele não acreditava que a invasão russa pudesse de fato acontecer em pleno século 21. 


De um momento para o outro, a vida do casal e da filha, tomou uma direção nunca antes pensada: o marido ficou na Ucrânia, enquanto Natasha e a menina Sasha conseguiram encontrar refúgio em Portugal. Foi em Lisboa, que a também fotógrafa contou a sua história para a ONU News. Mas até chegarem em terras lusas, a família passou por várias cidades. 

Travessia pela Ucrânia 

Natasha, a filha e a sogra ficaram hospedadas em abrigos para refugiados na Ucrânia e Romênia.
Foto: Nataliia Vladimirova, Arquivo Pessoal.
Natasha, a filha e a sogra ficaram hospedadas em abrigos para refugiados na Ucrânia e Romênia.

 

A primeira parada foi Dnipro, onde vivia um amigo. Mas logo no primeiro dia, as sirenes soaram: um sinal de que as explosões estão prestes a começar. Natasha conta que seu estado emocional foi rapidamente afetado: temendo o pior, decidiram ir para outra cidade. 


Chegam em Odessa, com a meta de estarem cada vez mais perto das fronteiras. A família tem a confirmação de que o marido não poderá seguir com elas: os homens entre os 18 e o 60 anos são obrigados a ficar na Ucrânia. A mãe dele, Nataliia Rodenko, junta-se ao grupo, que segue então para Kvuyry Rih. Mais sirenes tocam e a pequena Sasha quer saber o que aquele barulho significa.


Uma criança no meio da guerra 

A família de Natasha no voo para Portugal. Elas já deram entrada na documentação para o estatuto de refugiadas.
Foto: Nataliia Vladimirova, Arquivo Pessoal.
A família de Natasha no voo para Portugal. Elas já deram entrada na documentação para o estatuto de refugiadas.


Segundo Natasha, uma senhora explica à menina que ela deve tapar os ouvidos e abrir a boca. Da próxima vez que as sirenes soam, Sasha conta à mãe que já sabe exatamente o que fazer. Mas a especialista em economia nota que uma criança de quatro anos não deveria precisar aprender isso, nunca.


A família finalmente atravessa a fronteira de carro e chega à Romênia, onde permanece por quatro dias. Voluntários da Cruz Vermelha prestam assistência, ajudam as três a encontrar abrigo e na capital Bucareste, ficam sabendo que o governo de Portugal está organizando um voo humanitário para refugiados ucranianos. 

Ela pensa no clima ameno em Portugal, na proximidade com o mar e decide aceitar o desafio em buscar refúgio em um país onde nunca estiverem e onde não conhecem ninguém. Chegam no dia 14 de março e novamente, com a ajuda de voluntários, Natasha, a sogra e a filha foram acolhidas por uma família portuguesa que vive em Lisboa e que abriu as portas de casa para as ucranianas. 

Ucraniana refugiada que foi recebida por família em Portugal conta sua história

Solidariedade de desconhecidos 


Natasha faz questão de contar que as roupas que ela e a sogra estão vestindo foram doadas por amigos da família que lhes ofereceu hospedagem. Gestos de bondade de desconhecidos que fazem toda a diferença em um momento delicado. 

Emocionada, ela revela seu maior medo: não conseguir voltar a encontrar com o marido, com quem consegue conversar por videochamada duas vezes ao dia. A filha já está registrada como refugiada junto aos Serviços de Estrangeiros e Fronteiras de Portugal, SEF, enquanto Natasha e a sogra estão no processo de conseguir a documentação. 


Os próximos objetivos de Natasha são encontrar trabalho e vaga em uma escola para a filha. A ansiedade que sente quando vê as notícias sobre a Ucrânia é intercalada por momentos de alívio por saber que estão em segurança.


Entre os dias 24 de fevereiro e 27 de março, o SEF havia fornecido status de proteção temporária a mais de 22,7 mil ucranianos e cidadãos de outros países que estão morando na Ucrânia até a invasão russa. O governo português está facilitando a emissão de documentação para os refugiados e criou um site especial de apoio a essa população, o portal Portugal for Ukraine.