Covid-19 leva à baixa no número de pessoas tratadas com HIV indetectável
Limitação de serviços entre causas que ditaram queda de quase 20% desde o início do ano; relatório cita Angola e Timor-Leste por barreiras discriminatórias em centros hospitalares; Portugal e Moçambique elogiados por medidas sobre serviços.
O Programa Conjunto da ONU sobre HIV/Aids, Unaids, apela por solidariedade global e responsabilidade compartilhada para que a resposta ao vírus volte ao rumo certo para acabar com a epidemia até 2030.
Nesta quinta-feira, a agência lançou um relatório realçando a subida de apenas 2,4% no número de pessoas recebendo terapia antirretroviral para 26 milhões no primeiro semestre de 2020. A taxa é a metade da que foi alcançada entre janeiro e junho de 2019.
Acesso
No geral, mais 4 milhões de pessoas precisariam ter acesso ao tratamento para se atingir a meta de 30 milhões de pacientes com acesso aos antirretrovirais até o final deste ano.
Com a Covid-19 foram interrompidos serviços especializados e sobrecarregadas as cadeias de abastecimento. Por vários meses se observaram os níveis mais baixos de novos diagnósticos e início de tratamento como o reflexo dessa situação.
As interrupções e regras de distanciamento físico dificultam ou tornam impossível realizar encontros diretos com pacientes. As desacelerações econômicas rápidas e repentinas aumentaram a pobreza e a fome. O receio do Unaids é que os efeitos fiscais em muitos países limitem os investimentos na resposta nacional.
A agência realça, no entanto, que com a pandemia houve agilidade na resposta ao HIV e foram vistos vários benefícios indiretos dos investimentos em sistemas de saúde e no desenvolvimento da infraestrutura para combater o vírus.
Lusófonos
O estudo cita países de língua portuguesa onde indivíduos na faixa dos 15 a 49 anos relataram atitudes discriminatórias em relação às pessoas vivendo com HIV. Angola teve cerca de 40% e Timor-Leste acima de 70%.
Já Portugal é elogiado por ter adotado uma lei abrindo o caminho para que migrantes regulares e irregulares tenham acesso completo aos serviços de saúde. Para a agência, esse é “um modelo de trabalho na prestação de serviços que pode ser replicado”. O Unaids destaca ainda a luta difícil de muitos migrantes para ter acesso à saúde e aos serviços de HIV, sendo que uma legislação concertada criaria “um ambiente favorável para o acesso de migrantes aos serviços independentemente de seu status.”
Moçambique está entre 46 nações identificadas num estudo que em meados de 2020 constatou que baixaram em mais de metade as visitas dos pacientes a centros hospitalares, mas continuaram a ter remédios. Estes países liberalizaram de forma temporária as políticas para as pessoas tratadas em situação mais estável.
Falha coletiva
Sobre o rumo em direção à visão de zero novas infecções, zero discriminação e zero mortes devido à doença, o estudo defende que dados dos últimos anos são “mistos e bem aquém das aspirações globais”.
Entre 2015 e 2020 houve 3,5 milhões de novas infecções pelo HIV. Mais de 820 mil pessoas perderam a vida por doenças relacionadas ao vírus pela falha coletiva em investir o suficiente, tendo em conta os direitos e as medidas centradas na pessoa.
No entanto, entre 2010 e 2019 baixou em 39% o número global de mortes relacionadas à Aids, para 690 mil. Para a Unaids, esse é um motivo de orgulho, mas o número ultrapassa de longe a meta de redução de óbitos para menos de meio milhão até este ano.
A agência considera perturbador que em 13 países o estigma e discriminação continuem frequentes em unidades de saúde, manifestadas com negação de atendimento, atitudes desprezo, coação ou violação de confidencialidade.
90-90-90
A Unaids considera “relativamente positivo” o desempenho global na meta 90-90-90, que visa ter 90% das pessoas vivendo com o HIV diagnosticadas; 90% dos soropositivos em tratamento e 90% deles com a carga viral indetectável.
No final do ano passado, cerca de 81% soropositivos conheciam seu estado, 82% deles recebiam tratamento e 88% dos pacientes tratados tiveram a supressão viral. Mas a queda de serviços baixou a proporção dos que suprimiram o vírus para 59%.
Desafios
No entanto, as novas infecções em crianças caíram em mais da metade entre 2010 e 2019.
Este progresso é considerado lento na eliminação da transmissão vertical desde 2016. Entre os principais fatores estão os desafios relacionados ao diagnóstico de mulheres infectadas no final da gravidez e na amamentação.
O Unaids quer mais esforços para superar os desafios em tempo de pandemia. O relatório quer uma análise das metas para os próximos cinco anos e que os ambientes sejam propícios para a prestação de serviços aos que mais precisam.