Michelle Bachelet alerta para “situação alarmante” no norte de Moçambique BR

Alta comissária da ONU para os Direitos Humanos destaca violência que causou mais de 350 mil deslocados em três anos; insegurança piorou nas últimas semanas, com relatos de dezenas de decapitações e sequestros no extremo norte.
A alta comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, pediu esta sexta-feira medidas urgentes para proteger os civis na província de Cabo Delgado, no nordeste de Moçambique.
Em comunicado, Bachelet destaca “uma situação cada vez mais alarmante dos direitos humanos”, com ataques de grupos armados e confrontos com as forças de segurança em diferentes partes da província.
Nas últimas semanas, segundo o Escritório de Direitos Humanos, dezenas de pessoas morreram e centenas foram forçadas a fugir de suas casas em busca de refúgio nas áreas do sul.
Cerca de 350 mil pessoas foram deslocadas pela violência nos últimos três anos. Desde 16 de outubro, mais de 14 mil pessoas fugiram por mar e chegaram à capital da província, Pemba. Pelo menos um barco virou, deixando cerca de 40 mortos, incluindo crianças.
O Escritório acredita que milhares de pessoas, incluindo os mais vulneráveis, ainda estão isolados em áreas de conflito, muitos deles se escondendo no mato por vários dias.
O conflito e o deslocamento também agravaram a insegurança alimentar. Os serviços públicos, incluindo escolas e centros de saúde, foram destruídos ou fechados nos distritos mais afetados.
Algumas áreas foram privadas de qualquer ajuda humanitária por mais de seis meses, já que muitos distritos estão efetivamente isolados do resto da província.
Em comunicado, Bachelet afirma que “a situação é desesperadora, tanto para aqueles presos em áreas afetadas pelo conflito, com quase nenhum meio de sobrevivência, quanto para os deslocados em toda a província e além.”
A alta comissária lembra aqueles que ficaram privados de suas necessidades básicas, correm o risco de serem mortos, abusados sexualmente, sequestrados ou recrutados à força por grupos armados.
Para ela, “é fundamental que as autoridades do Estado garantam a proteção dos civis dentro e fora das áreas afetadas e que as agências humanitárias tenham acesso seguro e desimpedido para prestar assistência e proteção.”
Esse acesso é particularmente importante, dado o risco de cólera e a propagação da pandemia de Covid-19. Cabo Delgado está entre as regiões mais afetadas pelo coronavírus em todo o país.
Segundo o Escritório, desde 2017, elementos e grupos armados cometeram graves abusos dos direitos humanos e, mais recentemente, violações do direito internacional humanitário.
Esses abusos incluem assassinatos e mutilações, saques, destruição de casas e instalações públicas e religiosas, sequestros, abusos de meninas e mulheres e possível recrutamento forçado de crianças.
Nas últimas duas semanas, houve uma série de ataques em vários vilarejos. Relatos de testemunhas indicam que várias casas e instalações públicas foram queimadas e dezenas de pessoas mortas, incluindo decapitações de mulheres, crianças e homens, bem como sequestros de homens armados.
O Escritório afirma, no entanto, que “a dificuldade de acesso às áreas afetadas torna a verificação desses relatos extremamente difícil.”
Nos últimos anos, também houve relatos de “violações dos direitos humanos cometidas pelas forças de segurança moçambicanas, incluindo execuções extrajudiciais, maus-tratos, violações do uso da força, detenções arbitrárias, incluindo de jornalistas, e restrições ilegais à liberdade de circulação”.
Bachelet afirma que “as pessoas cujos direitos foram violados têm direito a proteção e reparação.”
Segundo ela, “todas as alegadas violações e abusos do direito internacional dos direitos humanos e do direito internacional humanitário cometidos por grupos armados e forças de segurança devem ser investigados de forma completa, independente e transparente pelas autoridades competentes.”
A alta comissária lembra que todas as partes em conflito devem cumprir as suas obrigações de direito internacional e o Estado moçambicano deve assegurar que quaisquer forças sob o seu controlo, incluindo forças militares privadas contratadas, respeitem estas obrigações.
A alta comissária elogia as declarações recentes das autoridades se comprometendo a respeitar o direito internacional e seus esforços para mobilizar a assistência humanitária para ajudar os deslocados e as comunidades de acolhimento.
Para terminar, Bachelet afirma que o seu escritório continua empenhado em apoiar o Governo e o povo de Moçambique nesses esforços.