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Conselho de Segurança debate agravamento da crise no Iêmen  BR

Trabalhador humanitário em um armazem do PMA, em Sana. Ajuda à alimentação já foi cortada nos últimos meses.
PMA/Mohammed Awadh
Trabalhador humanitário em um armazem do PMA, em Sana. Ajuda à alimentação já foi cortada nos últimos meses.

Conselho de Segurança debate agravamento da crise no Iêmen 

Paz e segurança

Enviado especial ao país e chefe humanitário da ONU falaram sobre escalada da violência e crise da pandemia que intensificam conflito civil; em setembro, agências humanitárias ficarão sem dinheiro para atender mais de 250 mil crianças com desnutrição grave. 

Existe um risco real de que as negociações de paz no Iêmen falhem e o país entre em uma nova fase de escalada do conflito, com disseminação descontrolada da Covid-19 e declínio econômico. 

O alerta foi feito esta terça-feira no Conselho de Segurança pelo enviado especial da ONU para o Iêmen, Martin Griffiths. Pela segunda vez desde o início da pandemia, o encontro aconteceu presencialmente na sede da ONU em Nova Iorque.  

Enquanto as conversações continuam, a vida se tornou ainda mais implacável para os iemenitas em todo o país

Negociações  

Griffiths contou que o objetivo das negociações intermediadas pela ONU é levar a  um cessar-fogo nacional, novas medidas econômicas e humanitárias e à retomada do processo político para acabar com o conflito. 

As negociações estão em andamento há quatro meses, mas as duas partes ainda não chegaram a um acordo sobre um texto final. O enviado da ONU afirmou que “o processo tem sido longo e desafiador.” 

Griffiths disse, no entanto, que “as negociações precisam ser concluídas antes que a janela da oportunidade se feche.” Segundo ele, “enquanto as conversações continuam, a vida se tornou ainda mais implacável para os iemenitas em todo o país.” 

Ele explicou que “o Iêmen está passando pelos piores momentos” e que “a situação militar não melhorou no mês passado.” 

Petroleiro 

Falta de financiamento para programas no Iêmen está colocando vidas em risco.
Segundo a ONU, a falta de financiamento para os seus programas no Iêmen está colocando vidas em risco. , by © Unicef

Há duas semanas, o Conselho de Segurança discutiu a situação do FSO Safer, um petroleiro em decomposição na costa do país que ameaça derramar mais de um milhão de barris de petróleo no Mar Vermelho, com danos ambientais e humanitários potencialmente catastróficos. 

Segundo Griffiths, nada mudou desde então. A ONU ainda aguarda as permissões necessárias para enviar uma equipe que avalie as condições de segurança do navio. 

Situação humanitária 

O subsecretário-geral das Nações Unidas para Assuntos Humanitários, Mark Lowcock, disse ao Conselho que “a crise humanitária no Iêmen nunca esteve tão mal.” 

Ele disse que “a fome está novamente no horizonte, o conflito aumentando e a economia em frangalhos.” 

Além disso, as agências humanitárias estão quase sem dinheiro e a Covid-19 está se espalhando sem controle. 

Crises 

O chefe humanitário da ONU citou cinco questões: proteção de civis, acesso humanitário, financiamento, economia e progresso em direção à paz. 

Em relação à proteção de civis, ele disse que as hostilidades estão se intensificando em todo o país. Atualmente, existem 43 linhas de frente ativas. Em janeiro, eram apenas 33. 

Pelo terceiro trimestre consecutivo, o número de incidentes envolvendo civis também aumentou. 

Quanto ao acesso humanitário, está melhorando no norte, mas o sul preocupa com um aumento dos ataques a bens humanitários e o aumento dos requisitos burocráticos. 

O Iêmen é uma das piores crises humanitárias do mundo, com 24 milhões de pessoas afetadas.
O Iêmen é uma das piores crises humanitárias do mundo, com 24 milhões de pessoas afetadas, PMA /Jonathan Dumont

Financiamento 

Lowcock disse ainda que “o financiamento da operação de ajuda está à beira do colapso”, detalhando vários cortes nas atividades mais importantes. 

No ano passado, a ONU chegava com alimentos a 13 milhões de pessoas todos os meses. Nesse momento, apenas 5 milhões recebendo rações completas e 8 milhões tiveram os alimentos cortados pela metade.  

Até agora, as organizações humanitárias receberam cerca de 18% do financiamento necessário. O subsecretário-geral afirmou que “o que era uma das operações humanitárias mais bem financiadas em todo o mundo é agora uma das mais subfinanciadas.” 

Se a situação não mudar, já no próximo mês, os programas de água e saneamento em 15 cidades do país terão um corte de 50%.  

Em setembro, quase 400 unidades de saúde, incluindo 189 hospitais, perderão o suprimento de água potável e medicamentos essenciais, cortando a assistência médica para 9 milhões de pessoas. 

No mesmo mês, as agências humanitárias ficarão sem dinheiro para tratar mais de 250 mil crianças que sofrem de desnutrição grave. Lowcock afirmou que “sem tratamento, essas crianças vão morrer.” 

A crise humanitária no Iêmen nunca esteve tão mal

Para o chefe humanitário, “não é difícil prever os efeitos de menos alimentos, menos água e menos cuidados de saúde.” Segundo ele, “sem mais financiamento, todos devem esperar grandes aumentos de fome, desnutrição, cólera, Covid-19 e, acima de tudo, morte.” 

Economia  

Em relação à economia do Iêmen, Lowcock afirmou que “está em queda livre.” 

Muitos iemenitas estão perdendo renda a um ritmo alarmante. As remessas de migrantes foram essenciais durante anos para a sobrevivência de muitas pessoas, mas agora a pandemia de Covid-19 reduziu este recurso em cerca de 70%. 

Além disso, cerca de metade das famílias perdeu pelo menos 50% de sua renda desde abril. 

Por fim, o chefe humanitário falou sobre o progresso em direção à paz, dizendo que financiamento adequado para a ajuda humanitária “pouparia o sofrimento desnecessário de milhões de pessoas, o que ajudaria a criar mais espaço para o processo político.” 

Para Lowcok, a escolha é simples. A comunidade internacional deve “ajudar o Iêmen agora ou ver o país caindo no abismo.”