Violência étnica na RD Congo pode representar crimes contra a humanidade BR

Relatório da ONU descreve situações de "barbárie” no nordeste do país para forçar congoleses a abandonar suas terras; em menos de dois anos, pelo menos 701 pessoas foram mortas e 142 foram vítimas de violência sexual.
Assassinatos, estupros e outras formas de violência que ocorreram na República Democrática do Congo podem representar crimes contra a humanidade.
A informação faz parte de um relatório do Escritório Conjunto das Nações Unidas para os Direitos Humanos divulgado esta sexta-feira.
#DRC: UN #humanrights report finds killings, rapes & other forms of violence targeting Hema community in DRC province of Ituri may amount to crimes against humanity. Report calls on authorities to conduct an independent & impartial investigation. 👉 https://t.co/SRSGwSiVBP pic.twitter.com/WKszaTFiXk
UNHumanRights
Segundo a pesquisa, pelo menos 701 pessoas foram mortas e 168 feridas durante conflitos entre as comunidades Hema e Lendu, nos territórios de Djugu e Mahagi, no nordeste da RD Congo, entre dezembro de 2017 e setembro de 2019. Além disso, pelo menos 142 pessoas foram vítimas de violência sexual. A maioria das vítimas pertencia à comunidade Hema.
A partir de setembro de 2018, grupos armados de Lendu se tornaram mais organizados nos ataques contra os Hema e outros grupos étnicos, como os Alur. O objetivo é controlar as suas terras e os seus recursos, diz o documento.
O relatório lista numerosos casos de mulheres sendo estupradas, crianças assassinadas e aldeias sendo saqueadas e queimadas.
Em 10 de junho de 2019, no distrito de Torges, um homem da comunidade Hema tentou impedir que homens armados estuprassem sua esposa e acabou vendo seu filho de oito anos ser decapitado.
O relatório descreve outras situações de "barbárie”, incluindo decapitação de mulheres e crianças e desmembramento e remoção de partes do corpo das vítimas como “troféus de guerra”. Segundo os investigadores da ONU, isso “reflete o desejo dos agressores de infligir traumas duradouros às comunidades Hema para forçá-los a fugir e não retornar às suas aldeias."
Escolas e hospitais também foram alvejados e destruídos. A maioria dos ataques ocorreu em junho, no período da colheita, e em dezembro, durante a estação de semeadura. O relatório afirma que o objetivo é "tornar mais difícil para os Hemas cultivar seus campos agravando a falta de comida."
Desde fevereiro de 2018, quase 57 mil pessoas encontraram refúgio no Uganda e mais de 556 mil fugiram para regiões vizinhas, de acordo com a agência das Nações Unidas para os Refugiados, Acnur. Vários campos e aldeias onde os Hema se refugiaram foram invadidos, queimados e destruídos pelos grupos armados de Lendu.
Os investigadores da ONU também documentaram atos de represália conduzidos por membros das comunidades Hema, incluindo a queima de aldeias e ataques contra o Lendu.
Segundo o relatório, as forças do exército e da polícia não conseguiram impedir a violência. Além disso, as próprias forças de segurança cometeram abusos, como execuções extrajudiciais, violência sexual, prisões e detenções arbitrárias. Dois policiais e dois soldados já foram condenados por tribunais congoleses.
O Escritório Conjunto de Direitos Humanos recomenda que as autoridades resolvam as causas do conflito, como acesso a recursos, e continuem com os esforços de reconciliação entre as duas comunidades. Também pede maior presença do Estado e forças armadas na região.
O relatório pede ainda que as autoridades façam uma investigação independente e imparcial sobre estes casos, além de garantir a compensação das vítimas e o acesso a cuidados médicos e psicossociais.
O Escritório Conjunto de Direitos Humanos da ONU, que produziu o relatório, foi criado em fevereiro de 2008 e inclui especialistas da Divisão de Direitos Humanos da Missão da ONU no país, Monusco, e do Escritório do Alto Comissariado de Direitos Humanos.