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Cidade de Paraty, no Brazil

ESPECIAL: Inclusão de Paraty e Ilha Grande em lista de Patrimônio Mundial da Unesco BR

Oscar Liberal/Divulgação Iphan
Cidade de Paraty, no Brazil

ESPECIAL: Inclusão de Paraty e Ilha Grande em lista de Patrimônio Mundial da Unesco

Cultura e educação

Especialistas destacam reconhecimento da “importância da relação entre o homem e a natureza”; região é a primeira no Brasil a integrar patrimônio natural e cultural ao mesmo tempo; para Unesco, área “realmente tem um valor excepcional”.

Paraty e Ilha Grande: Cultura e Biodiversidade é agora o 22º bem brasileiro a receber o reconhecimento internacional de Patrimônio Mundial.

A decisão foi tomada pelo Comitê do Patrimônio Mundial da Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura, Unesco, durante a sua 43ª sessão que acontece em Baku, capital do Azerbaijão.

Centro histórico de Paraty, no Brasil
Centro histórico de Paraty, no Brasil, by Oscar Liberal/Divulgação Iphan

Sítio Misto

A região é a primeira no Brasil a se tornar sítio misto do Patrimônio Mundial, reconhecida como patrimônio natural e cultural ao mesmo tempo. Ela abrange porções territoriais de oito municípios dos estados de São Paulo e Rio de Janeiro, sendo que a maior parte da área núcleo está em Paraty e Angra dos Reis.

O novo patrimônio brasileiro inclui o Parque Nacional da Serra da Bocaina, o Parque Estadual da Ilha Grande, a Reserva Biológica Estadual da Praia do Sul, a Área de Proteção Ambiental de Cairuçu e o Centro Histórico de Paraty e Morro da Vila Velha.

Falando à ONU News de Brasília, a coordenadora de cultura da Unesco no Brasil, Isabel de Paula, disse que a área tem realmente um valor excepcional, tanto do ponto de vista cultural como histórico e que o reconhecimento é importante por vários motivos.

“Primeiro, porque é a primeira candidatura de um sítio misto no Brasil, isso é importante, que tenta preservar e garantir as características tanto culturais quanto naturais de sustentabilidade de uma região. Ela é muito importante também porque ela reconhece a importância dessa relação entre o homem e a natureza, as pessoas e o meio ambiente. Ali está expressado como que comunidades, como por exemplo, as comunidades quilombolas, as comunidades indígenas, as comunidades caiçaras presentes ali há muitos anos estão mantendo viva a tradição, a cultura dos seus antepassados e demonstram uma relação de sustentabilidade com a natureza.”

Isabel de Paula é coordenadora de cultura da Unesco no Brasil.
Isabel de Paula é coordenadora de cultura da Unesco no Brasil. , by ©Unesco

Critérios

Para se tornar um sítio do Patrimônio Mundial da Humanidade, o país que propõe a candidatura deve elaborar um documento que expresse as características do local que atendam a um ou mais dos critérios estabelecidos no Guia Operacional para a Implementação da Convenção do Patrimônio Mundial.

A agência da ONU destaca que o quinto critério de avaliação utilizado na escolha dos locais também foi “observado fortemente no sítio”.

Este critério estabelece que o local deve ser “um excelente exemplo de assentamento humano tradicional, uso da terra ou uso do mar que é representativo de uma cultura, ou culturas, ou interação humana com o meio ambiente, especialmente quando ele se torna vulnerável devido ao impacto de mudanças irreversíveis.”

A Unesco destaca que “grupos humanos, em diferentes momentos históricos de Paraty, viveram ao lado da paisagem exuberante e exploraram os recursos naturais, terrestres e aquáticos, formando uma interação entre a cultura e a natureza.”

Serra da Bocaina
Mario Douglas/Divulgação Iphan
Serra da Bocaina
Serra da Bocaina , by Mario Douglas/Divulgação Iphan

Comunidades Tradicionais

A agência acrescenta que “as comunidades tradicionais de Paraty baseiam suas atividades na utilização da terra e do mar, sendo a pesca artesanal uma atividade intensa, especialmente nas comunidades caiçara e em torno do centro histórico.”

Falando à ONU News de Brasília, o diretor de Patrimônio Material do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional do Brasil, Iphan, disse que acredita que o reconhecimento da Unesco valoriza o trabalho de preservação e recuperação feito pela população de Paraty e da região ao longo dos anos.

Andrey Rosenthal explicou que a candidatura do local foi feita com base em uma série de valores.

Diretor de Patrimônio Material do Iphan, Andrey Rosenthal.
Diretor de Patrimônio Material do Iphan, Andrey Rosenthal., by Divulgação Iphan

“Quando se construiu a narrativa que foi encaminhada a Unesco, o Iphan e o ICMBio fizeram questão de caracterizar esse local como uma espécie de um sistema como cultural, onde um conjunto de populações tradicionais vivem de maneira sustentável com a biodiversidade. E a partir de agora, com o reconhecimento, a gente espera que esses grupos todos sejam reconhecidos como de certa forma, detentores de conhecimentos e protagonistas dessa história de relação entre a natureza e bens culturais. Então nós temos as comunidades quilombolas ali localizadas, nós temos os conjuntos indígenas, sobretudo os Guaranis, e temos também as comunidades tradicionais caiçaras, ligadas a pesca tradicional. Portanto, no plano de gestão, isso já foi previsto no sentido de que a gente venha também a mantê-los e que eles nos ajudem a preservas esse bem.”

Brasil

O Brasil já possui sete sítios naturais e 14 sítios culturais na lista de patrimônio Mundial.

De acordo com a diretora e representante da agência no país, Marlova Jovchelovitch Noleto, a representação da Unesco no país “celebra a inscrição do novo sítio brasileiro na Lista do Patrimônio Mundial e parabeniza o Governo do país pelo excelente dossiê de candidatura apresentado ao Comitê do Patrimônio Mundial, que garantiu a Paraty e Ilha Grande a inscrição na Lista do Patrimônio Mundial Misto.”

Noleto apontou que com isso, “percurso até a conquista do título foi longo, durou mais de 10 anos, mas com dedicação, persistência e aprimoramento da candidatura o reconhecimento internacional foi concedido a esse sítio de excepcional valor universal para a humanidade.”

Mata Atlântica

Segundo a Unesco, o novo Sítio Misto brasileiro está localizado em um dos centros endêmicos da Mata Atlântica e representa uma das áreas de maior diversidade biológica para este local.

A biodiversidade acentuada reconhecida por esta área deve-se a fatores históricos e evolutivos associados a fatores geográficos que criaram uma diversidade única de paisagens com um conjunto de altas montanhas e forte variação altitudinal, onde seus ecossistemas ocupam áreas desde o nível do mar até cerca de 2 mil metros de altura.

Esta seção da Mata Atlântica representa a maior riqueza de endemismo para plantas vasculares ao longo deste local e apresenta 57% do total de aves endêmicas da região, o maior percentual encontrado entre as áreas mais importantes para a conservação de aves identificadas na Mata Atlântica.

Saíra na estrada Paraty-Cunha, na Serra da Bocaina.
Felipe Varanda/Divulgação Iphan
Saíra na estrada Paraty-Cunha, na Serra da Bocaina.
Saíra na estrada Paraty-Cunha, na Serra da Bocaina., by Felipe Varanda/Divulgação Iphan

Preservação

Para Isabel de Paula, da Unesco, a conquista da região contribuirá na preservação da área.

“O Brasil ganha, Paraty ganha e a região de Angra dos Reis também em termos de visibilidade porque o Brasil e Paraty passam a estar vistas internacionalmente pelos olhos do mundo todo como um lugar de valor excepcional e isso naturalmente atrai turismo, isso atrai novos investimentos do ponto de vista econômico, mas também, mais importante, ele atrai a necessidade de que os gestores públicos, as comunidades, se empenhem no compromisso de garantir tanto a sustentabilidade, a preservação do patrimônio histórico e cultural, como também, a conservação da natureza, da fauna e da flora dessa região, e também, preservar as características culturais, a vida com melhor qualidade para essas comunidades que formam a região.”

A coordenadora de cultura da Unesco explica que quando um sítio passa a fazer parte da lista de Patrimônio Mundial, existe uma espécie de acompanhamento por parte da agência e que os poderes públicos passam a ter que “prestar contas e apresentar relatório periódicos de como está se dando a conservação dessas regiões”. 

Turismo Internacional

Rosenthal do Iphan também acredita que o reconhecimento trará benefícios, já que ao apresentarem a candidatura, tanto os poderes municipais, como os estaduais e o federal, assumiram compromissos pela preservação do bem. Fora isso, a região também deve ter benefícios econômicos em relação ao turismo nacional e internacional.

“Naturalmente, em função da inscrição na lista do Patrimônio Mundial, o número de turistas que vão buscar e vão procurar a região de Paraty deverá aumentar, isso pelo simples fato desse patrimônio a partir de hoje pertencer a todos. Há um interesse, é um bem comum que nos une a partir de hoje.”

Praia de Aventureiros, em Ilha Grande, no Brasil.
Felipe Varanda/Divulgação Iphan
Praia de Aventureiros, em Ilha Grande, no Brasil.

Efeito Dominó

Para o diretor do Patrimônio Mundial do Iphan o reconhecimento deve trazer ainda benefícios para as regiões vizinhas e outros locais do país.

“Eu acho que é uma espécie de um efeito dominó no bom sentido, a gente aguarda, tem a esperança de que as demais comunidades, demais municípios, percebam como o patrimônio, quando trabalhado como um ativo, ele ajuda a impulsionar o desenvolvimento. É o caso de Paraty. Até em relação a outros municípios que optaram por demolir o seu patrimônio, destruir a sua tradição, e que hoje não estão nessa condição. Paraty felizmente soube preservar o seu patrimônio, acho que o Iphan teve um papel significativo nesse processo, mas de qualquer maneira, a gente tem que reconhecer o papel fundamental da comunidade local.”

Comitê

O Comitê do Patrimônio Mundial é composto por representantes de 21 Estados Partes da Convenção do Patrimônio Mundial, que se reúnem anualmente. O grupo de especialistas está encarregado de implementar a Convenção. Na lista de representantes estão os lusófonos Angola e Brasil.

Este ano, o Comitê do Patrimônio Mundial está examinando 35 nomeações para inscrição na lista do Patrimônio Mundial da Unesco. 

Também estão sendo avaliados o estado de conservação de 166 locais já inscritos na Lista do Patrimônio Mundial, 54 dos quais também figuram na Lista de Patrimônio Mundial em Perigo.

O objetivo desta lista é informar a comunidade internacional de condições que ameaçam as características que fizeram com que um local fosse inscrito como patrimônio mundial e estimular ações corretivas.

ONU News
Entradas do Brasil e Portugal no Patrimônio Mundial da Unesco