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"Comandantes de Mianmar precisam responder por acusações de genocídio", dizem especialistas

Os dois filhos de Nomtaz Begum, 30 anos, foram mortos em frente a ela em Mianmar
Ocha/Vincent Tremeau
Os dois filhos de Nomtaz Begum, 30 anos, foram mortos em frente a ela em Mianmar

"Comandantes de Mianmar precisam responder por acusações de genocídio", dizem especialistas

Direitos humanos

Grupo defende que comunidade internacional deve cortar todo o tipo de apoio financeiro para as Forças Armadas de Mianmar; grupo afirma que autoridades não estão julgando responsáveis por violência contra povo rohingya em 2017.

A Missão Internacional de Inquérito da ONU sobre Mianmar, FFM na sigla em inglês, apelou a comunidade internacional a cortar todos os apoios financeiros para as forças armadas de Mianmar.

A missão diz que “os comandantes precisam de ser isolados e levados perante um tribunal credível para responder às acusações de crimes de guerra, contra a humanidade e genocídio.”

Violações

Refugiados rohingya em Cox's Bazar

O presidente da FFM, Marzuki Darusman, disse que essas medidas são necessárias porque Mianmar não fez o suficiente para proteger os direitos humanos, incluindo os direitos de mais de um milhão de rohingyas que foram forçados a exilar-se.

Em setembro de 2018, a FFM entregou um relatório de 444 páginas sobre o tema ao Conselho de Direitos Humanos. A pesquisa documenta como “os militares de Mianmar violaram de forma brutal e sistemática os direitos humanos das minorias étnicas em todo o país.”

O documento explora as “operações de remoção” realizadas por militares contra a minoria rohingya no estado de Rakhine, em 2017, quando as forças de segurança mataram milhares de civis, estupraram e abusaram sexualmente de mulheres e meninas.

A explosão de violência forçou o êxodo de mais de 700 mil pessoas em dois meses. Após a violência, as autoridades de Mianmar nivelaram as aldeias rohingya com maquinaria pesada, destruindo provas criminais.

Neste momento, tanto os militares como o governo de Mianmar negam os fatos e não assumem qualquer responsabilidade por crimes sob a lei internacional.

Visita

As declarações da FFM foram feitas no final de uma visita de 10 dias ao Bangladesh, Malásia, Tailândia e Indonésia.

Em Cox's Bazar, Bangladesh, a FFM visitou o assentamento de Kutupalong, que abriga refugiados rohingya que fogem de Mianmar desde o início dos anos 90.

O presidente da FFM disse que, quando o mandato da missão expirar em setembro de 2019, entregará todo seu material ao Mecanismo Independente de Investigação de Mianmar, estabelecido pelo Conselho de Direitos Humanos.

Darusman pediu aos refugiados que “tenham esperança de que isso levará à eventual responsabilização daqueles que são responsáveis ​​pelo que aconteceu contra a comunidade rohingya."

Repressão

Com o novo apelo, os parceiros humanitários poderão ajudar a implementar  o currículo escolar de Mianmar para crianças rohingya em Bangladesh.
Mais de um milhao de rohingyas vivem na região, by Unfpa Bangladesh/Allison Joyce

O representante disse que os eventos de 2017 não foram incidentes isolados. Para ele, “foram o resultado de problemas estruturais alimentados pela ausência de um sistema político e legal que esteja disposto a acomodar a diversidade.”

Durante a visita à região, os especialistas da FFM encontraram funcionários do governo, agências da ONU, atores regionais e trabalhadores humanitários. Também reuniram com representantes de outras comunidades étnicas que relataram o medo de retornar a Mianmar devido à violência contínua.

A especialista Radhika Coomaraswamy disse que “o encontro com essas diferentes comunidades étnicas apenas ressaltou as descobertas de que o Tatmadaw, o Exército de Mianmar, cometeu atrocidades semelhantes contra muitos dos grupos étnicos que vivem dentro das fronteiras de Mianmar ao longo do tempo.”

Segundo a especialista, “a repatriação de refugiados permanece remota, até que o governo de Mianmar tome medidas concretas para proporcionar condições propícias ao retorno voluntário, seguro, digno e sustentável, incluindo a inclusão plena e igualitária na sociedade.”

Justiça

O membro da missão Christopher Sidoti disse que “não viu nenhuma prova de que o governo esteja agindo de boa-fé para resolver a crise ou facilitar o retorno seguro dos refugiados” e que, por isso, “a situação exige um aumento da pressão internacional.”

Sidoti afirmou que “deve dar-se atenção aos laços políticos, econômicos e financeiros dos militares de Mianmar para identificar quem, e o quê, pode ser usado para aumentar a pressão e reduzir a violência.”

A FFM não é a única instituição a investigar estes casos. O Tribunal Penal Internacional está realizando um inquérito e a missão pediu aos tribunais nacionais para processar os supostos criminosos.

A FFM apresentará o seu relatório final ao Conselho de Direitos Humanos da ONU em setembro de 2019.

Prioridades para proteger 1 milhão de rohingyas em Cox’s Bazar