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Direitos humanos entre os temas de filmes em cerimônia do Oscar deste ano BR

Cate Blanchett (à direita), embaixadora da Boa Vontade da Agência das Nações Unidas para Refugiados, com a diretora Nadine Labaki (à esquerda), na exibição do filme Cafarnaum , em Londres, Reino Unido.
Acnur/Tom Pilston
Cate Blanchett (à direita), embaixadora da Boa Vontade da Agência das Nações Unidas para Refugiados, com a diretora Nadine Labaki (à esquerda), na exibição do filme Cafarnaum , em Londres, Reino Unido.

Direitos humanos entre os temas de filmes em cerimônia do Oscar deste ano

Cultura e educação

Igualdade de gênero, marginalização das línguas indígenas, migração, crise de refugiados, vida das trabalhadoras domésticas, e pobreza são questões do trabalho das Nações Unidas presentes em alguns dos filmes do Oscar.

Duas mulheres, Yalitza Aparício e Nadine Labaki, podem fazer história neste domingo durante a 91ª cerimônia do Oscar que acontecerá em Los Angeles, nos Estados Unidos. A atriz mexicana Yalitza Aparício pode se tornar a primeira mulher indígena a ganhar a prestigiada estatueta de ouro por seu papel no longa Roma, do diretor Alfonso Cuarón.

Já Nadine Labaki, do Líbano, pode se tornar a primeira cineasta árabe a receber um Oscar por seu filme Cafarnaum.

Suas indicações ocorrem dois anos depois as discussões sobre a falta de diversidade nas listas de candidatos e vencedores do Oscar.

Yalitza Aparicio no fime Roma
Foto de Alfonso Cuarón
Yalitza Aparicio no fime Roma

Direitos Humanos

Este ano, a Academia também mostrou maior abrangência em termos da cobertura temática ao indicar filmes que destacam grandes questões internacionais, em particular relacionadas aos direitos humanos.

O filme Roma, por exemplo, destaca a necessidade de proteger as línguas indígenas, como a Mixtec, assim como a vida dos trabalhadores domésticos e as desigualdades sociais.

Já o filme Cafarnaum, coloca em evidência o sofrimento das crianças migrantes e refugiadas. Outro dois indicados, Green Book e BlacKkKlansman, Infiltrado no Clan, tradução em português, destacam questões de racismo nos Estados Unidos nos anos 60 e 70.

O enfoque no tema dos direitos humanos no mundo do cinema acontece quando o mundo acaba de celebrar o 70º aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Alfonso Cuarón e Yalitza Aparicio filmando uma cena do filme Roma
Alfonso Cuarón e Yalitza Aparicio filmando uma cena do filme Roma, by Netflix

Desigualdades Econômicas

O Diretor Alfonso Cuaron, elogiou a nomeação de Yalitza Aparício na categoria de Melhor Atriz e disse que essa foi a mais relevante das 10 nomeações que seu filme Roma conquistou.

A jovem, que fez sua estréia como atriz no filme, interpreta a empregada doméstica Cleo, que é Mixtec, uma comunidade indígena do México. Cleo trabalha para uma família de classe média no início dos anos 70, no bairro Roma, na Cidade do México.

Em entrevista à ONU News, Cuarón disse que, em seu país, os povos indígenas são particularmente afetados pelas desigualdades sociais. O diretor destacou que "não é difícil perceber que o poder econômico está estreitamente ligado à cor da pele, e que os povos indígenas são aqueles que geralmente acabam tendo o menor número de privilégios."

Cuarón ressaltou que o filme estimulou uma conversa sobre o racismo que persiste no México, o qual ele disse "ter sido ignorado por muito tempo". O diretor acrescentou que esse racismo "não foi apenas ignorado", mas que sua própria existência havia sido "negada".

Ele também observou que o tema do trabalho doméstico e dos direitos dos povos indígenas era em geral um tabu.

Línguas Indígenas

No inicio de fevereiro deste ano as Nações Unidas lançaram o Ano Internacional das Línguas Indígenas. Em relação a elas, Cuarón lamentou que sejam "muito reprimidas”.

No filme Roma, Cleo e Adela, sua amiga e companheira de trabalho doméstico, só falam sua língua indígena quando estão sozinhas "em seus próprios espaços”. Isso acontece na cozinha ou em seu quarto ou com a "menina que é menosprezada, ignorada e menosprezada pela parte masculina da família".

Cafarnaum

Em Cafarnaum, a diretora Nadine Labaki, indicada na categoria Melhor Filme Estrangeiro, destaca a situação das crianças refugiadas, seus direitos violados e como a extrema pobreza os afeta.

O filme conta a história de Zain, de 12 anos, um refugiado sírio que, apanhado no limbo do conflito e do deslocamento forçado, entra com uma ação contra seus pais por ter nascido.

O personagem principal, Zain, é ele mesmo interpretado por um refugiado que fugiu da Síria há oito anos.
Acnur/Sam Tarling
O personagem principal, Zain, é ele mesmo interpretado por um refugiado que fugiu da Síria há oito anos.

Em entrevista à ONU News, Labaki disse que tinha "um dever”, ”nem mesmo uma escolha”, de registrar a realidade da crise de refugiados nas ruas de seu país natal, o Líbano. O pequeno país, que também enfrenta seus próprios desafios políticos e econômicos, atualmente abriga cerca de 1 milhão de refugiados da Síria devido à guerra.

A diretora explica que decidiu usar sua única ferramenta, que é o cinema, “para contar essa história, para divulgar essa história e falar sobre essa luta”, porque era sua responsabilidade.

Ponto de Vista

Salientando que o problema dos refugiados está crescendo visivelmente, como se pode ver no Líbano onde "crianças trabalham nas ruas, carregando cargas muito pesadas e fazendo trabalhos muito difíceis”, Labaki disse que escolheu propositadamente contar esta história através da perspectiva de uma criança.

Para ela, uma criança "vê as coisas com muito mais clareza do que qualquer adulto porque não é informada ou alterada pelos códigos das sociedades, pela hipocrisia ou pela política".

Desde que o filme foi feito, Zain foi reassentado na Noruega,  graças aos esforços do  Acnur.
Desde que o filme foi feito, Zain foi reassentado na Noruega, graças aos esforços do Acnur., by Acnur/Sam Tarling

Labaki menciona Alan Kurdi, o menino sírio que se afogou e foi encontrado em uma praia turca em setembro de 2015. Ela conta que quando viu a imagem da criança se perguntou: “se ele pudesse falar, o que ele diria? O que ele diria ao mundo? Como ele abordaria os adultos que o colocaram nessa situação?"

Personagens

Os diferentes personagens do filme não são interpretados por atores profissionais, mas por migrantes e refugiados que enfrentaram situações semelhantes às que são mostradas no filme. O personagem principal, Zain, é ele mesmo interpretado por um refugiado que fugiu da Síria há oito anos.

A diretora contou que ele enfrentou "circunstâncias muito difíceis" e "nunca foi à escola". Ela explicou que a única diferença com o filme é que o verdadeiro Zain tem "pais amorosos”.

Desde que o filme foi feito, Zain foi reassentado na Noruega, onde vive agora graças aos esforços da Agência de Refugiados da ONU, Acnur.