Perspectiva Global Reportagens Humanas

Exclusiva: Patrick Kennedy

Exclusiva: Patrick Kennedy

Neste 10 de outubro, a ONU marcou o Dia Mundial da Saúde Mental com destaque para pessoas idosas. A Rádio ONU ouviu especialistas no assunto incluindo o fundador da organização de pesquisa para cura de doenças mentais “One Mind for Research”, Patrick Kennedy.

Neste mês de outubro, o ex-congressista americano está organizando o Kennedy Forum para comemorar o 50º aniversário da Lei sobre Saúde Mental nos Estados Unidos, sancionada pelo ex-presidente do país John Kennedy. Para Patrick Kennedy, as doenças mentais devem ser tratadas com o mesmo empenho dedicado às enfermidades  físicas.

Ele lembrou ainda que muitas pessoas na terceira idade sofrem de depressão e são erroneamente diagnosticadas com demência, uma vez que os sintomas se assemelham.

Leia a tradução na íntegra da entrevista de Patrick Kennedy à Rádio ONU (áudio em inglês).

Rádio ONU: Nós falamos há quase dois anos quando a organização “One Mind for Research” estava sendo lançada. Quais são os sucessos e desafios de lá para cá?

Patrick Kennedy: Bom, hoje é o Dia Mundial da Saúde Mental. A razão da “One Mind for Research” é fazer uma agenda que possa avançar como entendemos o cérebro humano. Com isso, poderemos ter curas mais rápidas para doenças mentais de todos os tipo. “One Mind for Research” acabou de receber finaciamentos para o Projeto de Pesquisa sobre Lesões Traumáticas do Cérebro, conhecida como Tract- TBI, pelo Instituto Nacional de Desordens Neurológicas. E este financiamento veio da Liga Nacional de Futebol (americano), NFL. E tem como objetivo um melhor entendimento sobre traumatismos cranianos e como melhor tratamos, diagnosticamos e fazemos a recuperação (ou a falta de recuperação) para aqueles que sofreram um lesão traumática cerebral. Isso nos vai ajudar a compreender não só como melhor tratar este tipo de ferimentos, mas também em entender outras desordens neurológicas degenerativas que frequentemente têm sintomas comuns como Parkison, ALS, Alzheimer ou até desordens cognitivas como demência de uma forma geral. Lesões traumáticas do cérebro resultam em todos os outros tipos de sintomas. E para melhor diagnosticar, identificar e tratar lesões traumáticas, eu acredito que nós estaremos numa posição melhor para responder a estas outras condições que também têm sintomas similares aos traumas cerebrais, e essas são doenças como Alzheimer, esclerose múltipla, Alzheimer e ALS.

Sistema Público de Saúde

RO: Hoje é comemorado o Dia Mundial da Saúde Mental e o tema deste ano é saúde mental e idosos. Dois tópicos da agenda de saúde que são negligenciados em vários países. O que o sr. acha que deve ser feito para chamar mais atenação para pessoas na terceira idade que têm problemas mentais?

PK: Nós estamos trabalhando em nível internacional porque a União Europeia tem a campanha “healthy brain, healthy Europe”. O primeiro-ministro britânico, David Cameron levou o tema ao último encontro do G-8 discutindo a importância de se destacar a pesquisa sobre Alzheimer. Há muitos países que têm sistema público de saúde como Grã-Bretanha, Irlanda e outros países europeus que têm como acompanhar melhor resultados a longo prazo. Já nos Estados Unidos, não temos o mesmo benefício desse tipo de informação no nosso sistema de saúde. Por isso também precisamos trabalhar com nossos parceiros internacionais para ter acesso a estes recursos. E também porque teremos mais sucesso se pudermos compartilhar estes dados comuns. Se compartilharmos informações sobre as melhores práticas para tratar todas os tipos de doenças relacionadas ao cérebro. Estaremos melhores equipados para identificar e tratar essas doenças se compartilharmos as nossas experiências nesta área.

Dia da Saúde Mental. Foto: OMS Coração e Câncer

RO: Seus pesquisadores na One Mind for Research dizem que as desordens mentais custam mais à sociedade que doenças do coração e câncer combinadas. Como é que uma situação de saúde tão dispendiosa recebe tão pouca atenção?

PK: Bom, nós todos vamos ao médico para fazer o check-up. E eles checam os nossos níveis de colesterol, pressão arterial, câncer ou diabetes. Eu acho que eles têm que começar a checar a gente da nuca para cima. Em outras palavras, nós temos que ser checados contra depressão, ansiedade e vícios. Assim como nos checam contra demência. Eu acho que muitos idosos sofrem de depressão e frequentemente perderam alguém da família, ou perderam a própria saúde quando envelheceram. E todas essas coisas criam um desgaste emocional enorme. Muitos idosos sofrem muito com doenças mentais. E nós pensamos que eles estão com demência porque os sintomas são quase os mesmos. As pessoas aparentam confusão, desorientação, que são sintomas de depressão, mas também de demência.

RO: Um dos especialistas que entrevistamos hoje de manhã sobre bipolaridade e depressão disse que muitos idosos começam a ter depressão, especialmente em grande cidades, porque eles não têm perspectiva ou não são valorizados pelos outros. Como é que esses fatores e também a questão da crise econômica global que deixou muitos com depressão crônica podem ser combatidos?

Familiares e Amigos

PK: As análises dizem que quando as pessoas estão sofrendo com doenças mentais, em muitos casos elas estão sofrendo também com isolamento. E para quem sofre depressão ou qualquer doença mental, a pior coisa que se pode fazer é isolá-los. O que as pessoas precisam é de estar conectadas com outros seres humanos, eles precisam de suas comunidades, de seus familiares, de seus amigos. O que todos nós precisamos fazer, é estarmos mais sensíveis às necessidades de todos os nossos familiares e amigos, e especialmente cidadãos na terceira idade, nossos pais e avós. Em muitos casos, eles se sentem isolados e neglicenciados naturalmente. Eles passam por essas grandes mudanças na vida deles, onde eles deixaram de trabalhar, não têm uma espécie de lugar de valor na sociedade. E os idosos podem se sentir deixados a sós ou isolados. E todos nós podemos fazer algo para ajudar. Nós talvez não sejamos capazes de curar a doença deles, mas podemos sim ajudar a aliviar na forma como respondemos a eles. E eu acho que todos nós podemos fazer algo mais para assegurar que nossos pais e avós não se sintam sozinhos. Nós podemos visitá-los, conversar com eles, abrigá-los e amá-los. Isso fará uma grande diferença no bem-estar deles.

RO: Vamos falar agora sobre doenças mentais causadas por conflitos e guerras. Isso não somente relacionado a soldados e outros militares que estão na frente das batalhas, mas também aos civis e aos refugiados que sofrem com as consequências desses combates durante e depois dos conflitos. Mais do que pesquisa neste caso, o sr. acha que ação e vontade políticas podem ajudar a tratar essas desordens mentais?

 Saúde Comportamental

Patrick Kennedy e o pai, o ex-senador Ted Kennedy PK: Como você sabe a Organização Mundial da Saúde diz que as deficiências  mentais representam um dos maiores fardos de todas as doenças. Você pode estar vivendo mas não vivendo, presente, mas ausente. Você sofre em silêncio com uma doença mental, com um problema de saúde. E isso tem enormes consequências porque você não se torna somente menos produtivo como ser humano, mas você é menos produtivo como trabalhador, está menos engajado na família, e isso acontece em todo o mundo. Não apenas nos países desenvolvidos, mas também em desenvolvimento. Nós tratamos de malária, do HIV, de doenças contagiosas, mas não tratamos as doenças mentais e o bem-estar destes pacientes da mesma maneira. Se você tratar as doenças mentais, terá melhores resultados em outras espécies de problemas de saúde e intervenções médicas. Muitos problemas médicos no mundo estão relacionados a problemas de saúde comportamental como fumo, bebida alcoólica e outras atividades que podem afetar sua saúde como um todo. Para resumir, saúde mental significa saúde como um todo. Bom, nós sabemos que o estresse pós-traumático é uma doença real. Existe uma consequência. E o trauma está em todas as partes. Naturalmente, os traumas registrados em guerras em situações onde são cometidos crimes contra a Humanidad precisam ser tratados. Os refugiados, por exenplo, estão sofrendo não só com o fato de estarem sendo fisicamente deslocados, mas também experimentando as emoções de estarem sendo deslocados. Nós precisamos ter pessoal humanitário não somente tratando da demanda de habitação e alimentos, mas também da demanda emocional que essas pessoas têm. E nós temos tratamento eficiente, pessoas que passaram por traumas também podem ajudar, às vezes eles são os canais mais úteis nestas situações. E eles podem ajudar se tiverem as ferramentas corretas, sabendo que elas tão experimentando os “sentimentos normais”, o que na realidade deveriam ser anormais, mas infelizmente são frequentes nestas regiões do mundo onde ocorrem as guerras, e as pessoas acabam sofrendo esses traumas em consequências delas.

Suicídio

RO: Patrick Kennedy, o seu próprio país, os Estados Unidos, está discutindo temas como o de assassinatos em massa e a relação deles com saúde mental. Outros preferem associar estas mortes a legislações que permitem a compra de armas de fogo e outros armamentos. Qual é a sua opinião?

PK: Na minha opinião, em cada um desses casos, a pessoa que abre o fogo é uma pessoa que exibiu muitos sintomas de doenças mentais que não foram tratadas. Para mim, a pergunta aí é: se eles tivessem recebido tratamento para seu problema mental, eles teriam praticado esses atos? Eu acho que se eles tivessem sido tratados, eles não estariam sofrendo com a doença e não teriam agido de uma forma trágica e violenta. Eu acredito que temos que tratar doenças mentais como qualquer outra doença física. Se você tem um ataque cardíaco, você é levado imediatamente para a emergência de um hospital. Mas se você está tendo um ataque psicótico, ou uma doença mental, nós frequentemente viramos as costas às pessoas sofrendo com as doenças mentais. Nós não levamos isso a sério como no caso de doenças físicas. Isso tem que mudar. Eu também adicionaria que além de todas essas tragédias, existe uma outra tragédia: a do suicídio. O sucídio mata 38 mil pessoas nos Estados Unidos por ano. É quase o dobro do número de pessoas que morrem em assassinatos em massa. Então a violência é mais frequente com as pessoas que sofrem de uma doença mental. Mas em ambos os casos, nós temos que fazer um trabalho melhor de intervir e prevenir as pessoas de ferirem as outras ou de se ferirem.

FIM