Perspectiva Global Reportagens Humanas

Pesquisadora explica mudança nos padrões de tráfico humano no mundo

Crises mudam padrões do tráfico humano e dificultam a identificação das vítimas

Não houve tantas oportunidades para a exploração sexual, para tráfico, para exploração durante a pandemia

Claire Healy , Pesquisadora do Unodc

© Unsplash/Hermes Rivera
Crises mudam padrões do tráfico humano e dificultam a identificação das vítimas

Pesquisadora explica mudança nos padrões de tráfico humano no mundo

Legislação e prevenção de crimes

Um novo relatório do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, Unodc, mostrou o impacto da pandemia e de conflitos no tráfico de pessoas; de Viena, a pesquisadora do Unodc, Claire Healy, explicou à ONU News, alguns dos fatores que podem ter influenciado essas estatísticas.

Qual é o principal ponto desse relatório do Unodc sobre vítimas de tráfico de pessoas? Aumentou ou diminuiu o número de vítimas?

Esse relatório de 2022 é muito importante porque o primeiro relatório global sobre a situação desde o início da pandemia. E mostra que houve uma descida pela primeira vez desde que o Unodc começou a coletar os dados sobre o tráfico de pessoas, no ano de 2009. O número de vítimas identificadas e o número de autores de tráfico de pessoas por todos os países para as quais temos os dados diminuiu. E isso chama muito a atenção.

Pandemia e conflitos impactam o tráfico de pessoas no mundo
OIM/Muse Mohammed
Pandemia e conflitos impactam o tráfico de pessoas no mundo

E o que causou essa diminuição? Quais foram os fatores?

São três fatores que contribuíram para esta dinâmica. Primeiro: nós sabemos pelas conversas, pelas informações que temos dos Estados-membros, que houve uma diminuição na capacidade de identificar vítimas e da capacidade de investigar casos de tráfico durante a pandemia, por causa de todas as restrições. Então, nós vemos, sobretudo, que houve menos casos de tráfico para fins de exploração sexual identificados. E, de fato, o número de casos de tráfico para trabalho forçado e o número de casos do tráfico de homens aumentou um pouco. Mas o número de mulheres identificadas como vítimas e o número de casos de exploração sexual diminuíram porque não houve a mesma capacidade. O segundo fator é que a exploração sexual foi mais clandestina durante a pandemia, não teve lugar nos lugares normais, digamos, que acontecia antes da pandemia, foi mais underground. E o terceiro fator é que, e isso é a única coisa a ser mais positiva em tudo isso, não houve tantas oportunidades para a exploração sexual, para tráfico, para exploração durante a pandemia, também por causa das restrições. E nós vemos também na análise dos dados, no relatório que houve menos casos de tráfico transfronteiriço, que também faz sentido. Não houve tantas oportunidades para essas translações, essas viagens, e esse número de casos de tráfico de pessoas transfronteiriços diminuiu. Mas, por outro lado, isso também tem a ver com essa falta de capacidade diminuída de identificar casos.

No geral, quem são as vítimas de tráfico de pessoas? O relatório traz uma informação relacionada ao gênero e idade?

Nós vemos no relatório as proporções de homens e mulheres, de meninas e meninos que foram traficadas ou que foram identificadas como vítimas de tráfico de pessoas. Isso também é interessante porque, no início, quando o Unodc começou a coletar esses estados, em 2009, e desde então sempre teve uma proporção muito grande de mulheres adultas identificadas como vítimas. Agora, este ano, e o relatório contém sobretudo os dados de 2022, 2021, vemos pela primeira vez uma proporção mais reduzida de mulheres vítimas identificadas. E um aumento sobretudo nos homens adultos identificados, mas também um aumento na identificação de meninos como vítimas de tráfico de pessoas. Isso tem a ver também com o ponto primeiro, a diminuição na identificação de casos de tráfico para a exploração sexual, porque houve até um aumento nos casos de trabalho forçado identificados, o que afeta sobretudo mais os homens e os meninos.

 Vimos, não só pela primeira vez, uma diminuição de identificação de vítimas, mas também uma diminuição de investigações e de condenações dos autores, o que é uma situação muito perturbantes, porque realmente as vítimas de tráfico de pessoas não estão tendo acesso a um direito da justiça

Os responsáveis pelo crime estão sendo punidos ou ainda há muita impunidade?

Sempre muita impunidade. E nós alertamos sempre para este problema no mundo com todos os relatórios globais sobre o tráfico de pessoas. Nós fazemos a cada dois anos, um relatório deste e é sempre um problema grande com a impunidade. Nós no Unodc temos outras metodologias para medir o problema do tráfico de pessoas e fora dos dados administrativos, porque este relatório global mostra só os dados administrativos que coletam os Estados-membros e aí já temos um problema. Agora, piorou bastante durante os últimos dois, três anos, porque houve menos capacidade não só de identificar casos de tráfico de pessoas, mas também de fazer processos criminais contra os autores. Aí vimos, não só pela primeira vez, uma diminuição de identificação de vítimas, mas também uma diminuição de investigações e de condenações dos autores, o que é uma situação muito perturbantes, porque realmente as vítimas de tráfico de pessoas não estão tendo acesso a um direito da justiça.

O que o Unodc está fazendo, não só em relação a isso, mas em relação ao problema geral?

Nós temos vários projetos, várias iniciativas, porque no combate ao tráfico de pessoas, o que é importante é a prevenção, claro, mas também a proteção das vítimas. E é claro, o processo criminal dos atores. Então, nós temos iniciativas em todas essas áreas e tem um quarto âmbito, que é a parceria. Então, organizamos iniciativas e consultas entre as autoridades de vários Estados-membros para promover essa parceria, porque, claro, quando é um crime transnacional, ele precisa disso. Também temos iniciativas para melhorar a identificação e proteção de vítimas de tráfico de pessoas. Por exemplo, treinamentos, nós também trabalhamos junto com os Estados-membros nas legislações, por exemplo, nas políticas. E também na prevenção, claro, tem várias iniciativas sobre sensibilização e para melhorar as perspectivas das pessoas que são mais vulneráveis ao tráfico de pessoas, para evitar que aconteça. E, finalmente, o que também é muito importante é a coleta de dados. O que representa este relatório global que apresenta esta coleta de dados, em nível mundial, mas também em nível nacional, regional. É muito importante isso e nós apoiamos os Estados-membros em fazer isto e fazemos a pesquisa para melhor entender este fenômeno e para melhorar a resposta. São todos esses tipos de atividades em que o Unodc está envolvido junto com os Estados-membros.