Brasileiro que lidera comissão relata “situação extremamente complexa” na Síria
Presidente da Comissão Internacional Independente de Inquérito sobre o país, Paulo Sérgio Pinheiro, falou à ONU News sobre o mais recente relatório que desaconselha o retorno de refugiados à nãção marcada pela violência.
Nesta entrevista a Eleuterio Guevane, a partir de Genebra, o líder do grupo de especialistas das Nações Unidas destaca o sofrimento de civis com a atuação de vários exércitos, organizações armadas e não estatais. A conversa começa com a descrição do atual cenário de direitos humanos que vem destacado na nova publicação.
Paulo Sérgio Pinheiro, PSP: Na realidade a esperança era que com a diminuição dos bombardeios aéreos em todo o território, e com a reconquista de território pelo governo da Síria, que a situação da população civil progressivamente fosse melhorando em termos das condições de vida. Ainda que em termos materiais seja um pouco irrealista esperar uma melhoria imediata.
Mas o que falamos que era uma guerra contra civis é que, na verdade, o governo continua praticando detenções arbitrárias, tortura e, enfim, as violações que sempre foram cometidas continuam ocorrendo.Evidentemente, para a sobrevivência e condições da população ela não se agravou. Em alguns casos, ela está mais agravada.
ONU News, ON: Ainda não há perspectivas da entrada da comissão lá no terreno?
PSP: Não, nenhuma. Se olhar no relatório, ele tem 45 páginas. E 21 páginas são cartas que nós enviamos ao Governo da Síria sobre todos os incidentes que nós descrevemos e nós não tivemos nenhuma resposta. Nós continuamos insistindo. Mas não vejo nenhuma perspectiva.
Nós continuamos porque, na verdade, a guerra continua em três regiões do país: no noroeste, no nordeste e no sul continua a guerra, inclusive com bombardeios aéreos por parte do governo e das suas forças aliadas.
Ao lado desses cinco exércitos você coloca organizações terroristas e organizações não estatais armadas que fazem ataques indiscriminados com foguetes, colocam bombas de controle remoto.
ON: Como resumir os 10 anos do trabalho da comissão?
PSP: Nesses 10 anos, cada ano foi diferente. Foi um ano de aumento de sofrimentos, de violações e escalada no número de refugiados. Hoje, depois de 10 anos, você tem cinco exércitos atuando na Síria. Você tem o governo sírio, você tem o governo russo, o governo americano que controla a situação no nordeste, depois você tem milicias iranianas e libanesas. Então é uma situação extremamente complexa para a população.
A população não está só submetida ao governo. Ao lado desses cinco exércitos você coloca organizações terroristas e organizações não estatais armadas que fazem ataques indiscriminados com foguetes, colocam bombas de controle remoto. Você vê o dia a dia da população enfrentando todas essas forças em combates entre si.
As populações leais ao governo também são submetidas a essas ações desses grupos armados não estatais. O trágico da situação não é só o que é da responsabilidade da Estado. Certamente é grande responsabilidade. Mas a responsabilidade é também das organizações não estatais armadas, patrocinadas por Estados. Nós sempre fazemos lembranças nos relatórios das responsabilidades dos países envolvidos no conflito pelas violações que esses grupos praticam.