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Entrevista com Marco Teixeira, chefe do Escritório da ONU sobre Drogas e Crime em Moçambique BR

Marco Teixeira é chefe do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, Unodc, em Moçambique
Unodc
Marco Teixeira é chefe do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, Unodc, em Moçambique

Entrevista com Marco Teixeira, chefe do Escritório da ONU sobre Drogas e Crime em Moçambique

Paz e segurança

O Escritório da ONU sobre Drogas e Crime, Unodc, tem um novo chefe em Moçambique. O português Marco Teixeira está no país e já começa com uma agenda cheia. Ele conversou com Leda Letra sobre o trabalho a ser desenvolvido e a insegurança em Cabo Delgado, no norte de Moçambique.

ONU News: A ONU News entrevista agora o chefe do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, Unodc, em Moçambique. Marco Teixeira fala conosco diretamente de Maputo. Obrigada por atender a ONU News para esta entrevista, Marco.

Marco Teixeira: Obrigado e é um prazer também partilhar um pouco com vocês nossa visão sobre o país e os desafios que o país enfrenta.

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ON: Marco, vamos começar falando sobre a situação em Cabo Delgado, que tem chamado a atenção da comunidade internacional. Quais são as informações mais atualizadas que o senhor pode passar para  nós sobre o trabalho do UNODC  na região, mais especificamente sobre o combate à ameça terrorista?

MT: De fato, como é de público conhecimento, há uma intervenção militar, há uma resposta militar de caráter multinacional, também no terreno, em Cabo Delgado. No quadro do que é a resposta das Nações Unidas para os desafios que aquela região enfrenta para Moçambique, o Unodc contribui apoiando para a resposta dos sistemas de justiça aos desafios relacionados com o terrorismo. Ou seja, nossa abordagem permite, ou tenta apoiar, de que forma se complementam as acoes militares com o normal e regular funcionamento do sistema de justica, que permite trazer a justica aqueles que possam estar implicados em acoes terroristas. Sempre com um principio que e o de respeito aos direitos individuais das pessoas, a presuncao de inocencia e garantir que a acao da justica recorre com o maximo de eficacia possivel. E assim que se reconstroi a confianca social no pais e nas instituicoes estatais.

Entrevista com Marco Teixeira, chefe do Escritório da ONU sobre Drogas e Crime em Moçambique

ON: O que o senhor poderia dizer sobre a situação no terreno, de momento, em Cabo Delgado?

MT: Naturalmente após qualquer intervenção militar, em qualquer contexto, existem ondas de choque colaterais. As populações começam a se redeslocar para os locais de que tinham saído e isso criam desafios não só securitários, como do ponto de vista do sistema de justiça e das autoridades policiais para garantir a ordem e a segurança e cabe a nós, ao Unodc, continuar a trabalhar com os atores do sistema de justiça, para obviamente garantir que a justiça possa ser servida e, acima de tudo, restabelecer esse elo de confiança e de normalidade institucional que parece que é importante para consolidar a paz, a segurança e o desenvolvimento.

Moçambicanos que fogem da insegurança em Cabo Delgado chegando de barco na praia de Paquitequete, Pemba
OIM/Sandra Black
Moçambicanos que fogem da insegurança em Cabo Delgado chegando de barco na praia de Paquitequete, Pemba

ON: O senhor poderia falar sobre o Plano de Ação de Maputo? O senhor escreveu um artigo à pedido da ONU News sobre o trabalho do Unodc aí em Moçambique e gostaria que explicasse então do que se trata este plano.

MT: Agradeço mais uma vez à ONU News em Português por me permitir falar e escrever no que é a minha língua materna, isso é um grande privilégio. Desde 2019 que o Unodc tem feito, de uma forma muito conjunta e integrada com vários setores do governo de Moçambique, desenhou um plano que é o Plano de Ação Estratégica de Maputo, para o engajamento do Unodc com o governo e as autoridades moçambicanas. Estabelece quatro áreas, quatro pilares de trabalho do Unodc no país. O primeiro é reforçar a resposta da justiça penal para combater o crime organizado de caráter transnacional. O segundo pilar é promover uma abordagem médico-sanitária de prevenção, tratamento e reabilitação de pessoas que têm condições de tóxico-dependência. O terceiro pilar é a prevenção e resposta ao terrorismo  e ao extremismo violento. Ou seja, apoiar o governo de Moçambique a encontrar as soluções e materializar essas soluções para a dimensão do terrorismo e de prevenção do extremismo violento. Por último, melhorar o sistema de justiça e a integridade judicial. E é neste quadro, nestes quatro pilares que o nosso plano de engajamento prevê que procuramos apostar na capacitação, na criação e apoio de políticas nacionais, complementando os esforços de capacitação com instrumentos e equipamentos que permitam apoiar as instituições para serem o mais eficazes possível. Este é o nosso documento estratégico que faz o elencar das nossas atividades, em parceria e muito estreita ligação com as prioridades do governo de Moçambique.

Unodc em Moçambique
Unodc
Unodc em Moçambique

ON: Minha pergunta final é exatamente sobre como o Unodc atua com o governo para proteger a população moçambicana das ameaças criminosas, em especial, do terrorismo?

MT: Há aqui duas vertentes. O Unodc não é uma agência de proteção humanitária imediata, mas o nosso trabalho no sistema de justiça criminal, promove que as pessoas suspeitas de estarem engajadas em atos terroristas possam vir a ser condenadas, baseada na legislação corrente e no normal funcionamento do sistema de justiça. Ou seja, previne-se que possam voltar a ofender pessoas, a praticar atos de terrorismo. Há esta vertente preventiva da ação. Por outro lado, não podemos esquecer que o normal funcionamento do Estado e do seu sistema de justiça criminal tem um fator de confiança para as populações que servem. Permite, acima de tudo, reprimir comportamentos que não são socialmente aceitáveis e nomeadamente no quadro das atividades que possam a vir ser consideradas atividades de terrorismo.