Obituário: Mário Soares 1924 – 2017
A ONU News apresenta momentos da vida do político e ativista pela independência que também advogou pela unidade entre países de língua portuguesa; ex-presidente de Portugal liderou painel de figuras de mais alto nível nas Nações Unidas.
Eleutério Guevane, da ONU News em Nova Iorque.
O ex-presidente de Portugal, Mário Soares, morreu neste sábado em Lisboa, cidade que o viu nascer há 92 anos. Em nota, o secretário-geral da ONU, António Guterres, afirmou ter recebido a notícia do ex-presidente português com "profunda emoção e um agudo sentimento de perda".
O último registo de Soares à ONU News foi numa entrevista por telefone em 2009, quando 13 anos após ter sido chefe de Estado, presidiu interinamente o júri sobre o Prémio da Unesco, Felix Houphouet-Boigny. A distinção da Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura coube naquele ano ao ex-presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva.
Língua PortuguesaNa conversa, Mário Soares destacou a importância da unidade em torno da língua portuguesa.
“ É uma língua só e não há variante nenhuma. Aliás, o presidente Sarney deu um exemplo também extraordinário quando foi presidente porque ele tem um artigo da Constituição brasileira que diz ‘o idioma oficial falado no Brasil é a língua portuguesa’. Portanto ele disse, um brasileiro, que é a língua portuguesa não a brasileira. No há língua brasileira e a portuguesa. É a mesma como a língua que se fala em Portugal, como a língua que se fala em Angola, como a língua que se fala em Timor-Leste e como a língua que se fala em todas as ex-colónias de Portugal. Portanto, tivemos a grande vantagem de todas elas adotarem como língua oficial o português.”
O ex-líder foi um personagem ativo em negociações da descolonização portuguesa ocorridas logo a seguir aos eventos de 25 de abril de 1974, que acabaram com mais de quatro décadas do regime salazarista.
Autodeterminação
Foi nesse ano que Mário Soares discursou pela primeira vez na Assembleia Geral da ONU como ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal. Na ocasião ele reconheceu o direito dos povos à autodeterminação.
O pronunciamento sublinhou progressos no processo que conduziu às independências de Angola e Moçambique no ano seguinte. Na mesma sessão, Soares expressou o “orgulho” com a entrada da Guiné-Bissau nas Nações Unidas.
No ano de 1951 já tinha sido licenciado em ciências histórico-filosóficas na Universidade de Lisboa, e seis anos depois concluiu o curso de Direito na mesma instituição.
Soares foi preso 12 vezes e por duas delas exilado. A primeira foi em São Tomé em 1968 e a segunda em Paris em 1970.
Chefe da diplomacia
A estreia na governação como chefe da diplomacia foi em três primeiros governos provisórios após o derrube do regime em 1974.
Uma outra passagem histórica pela ONU foi nos 50 anos da organização, quando Soares foi o primeiro a falar aos chefes de Estado e de Governo. O discurso exigia a autodeterminação do povo de Timor-Leste, a promoção do diálogo e da tolerância além da proteção de oceanos.
O primeiro presidente civil em Portugal em 60 anos ocupou dois mandatos presidenciais entre 1986 e 1996. Foi o posto público mais alto do filho de João Lopes Soares e antigo republicano liberal.
O percurso de Mário Soares é marcado por ser um dos fundadores da Ação Socialista Portuguesa, um grupo clandestino que em 1974 veio a transformar-se no Partido Socialista Português.
Nas Nações Unidas, presidiu o painel de pessoas proeminentes que apresentou um relatório sobre violência no terreno após visitar o local onde ocorreu um massacre na guerra civil na Argélia em 1988. O grupo era considerado o de nível mais elevado já constituído pela organização.
Soares presidiu ainda a Comissão Mundial Independente sobre os Oceanos lançada em finais de 1995 e acolhida pelas Nações Unidas. O relatório “O Oceano: Nosso Futuro” advogou a salvaguarda da riqueza dos mares e pedia a atenção para a sua importância no progresso social e económico do planeta.
Em 1991, Mário Soares criou uma fundação com o seu nome.
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