Perspectiva Global Reportagens Humanas

Relatores dizem que tratamento do Talibã a mulheres pode configurar crime contra humanidade

A forma como o movimento Talibã, a autoridade de facto no Afeganistão, tem tratado meninas e mulheres pode ser considerada crime contra a humanidade.
OIM/Paula Bonstein
A forma como o movimento Talibã, a autoridade de facto no Afeganistão, tem tratado meninas e mulheres pode ser considerada crime contra a humanidade.

Relatores dizem que tratamento do Talibã a mulheres pode configurar crime contra humanidade

Direitos humanos

Em comunicado, grupo de especialistas repudia violações “draconianas” a meninas e mulheres no país; em nota separada Escritório de Direitos Humanos da ONU condenou chibatadas a14 pessoas em público.

A forma como o movimento Talibã, a autoridade de facto no Afeganistão, tem tratado meninas e mulheres pode ser considerada crime contra a humanidade.

A declaração partiu de um grupo de relatores* e especialistas de direitos humanos num comunicado, divulgado na sexta-feira, em Genebra, sede do Conselho de Direitos Humanos.

Refugiados afegãos abrigam-se numa tenda depois de serem deslocados pelas inundações de monções no distrito de Nowshera, no Paquistão.
Acnur/Usman Ghani
Refugiados afegãos abrigam-se numa tenda depois de serem deslocados pelas inundações de monções no distrito de Nowshera, no Paquistão.

Perseguição de gênero e escola secundária

O texto aponta violações flagrantes dos direitos humanos e liberdades, classificadas como as mais “draconianas” em todo o mundo. Para os especialistas, trata-se de um caso de perseguição de gênero, que tem aumentado de forma severa e inaceitável.

As meninas afegãs continuam excluídas da educação secundária. As mulheres proibidas de frequentar lugares públicos como parques e academias de ginástica.

Em pelo menos uma região, as mulheres não são autorizadas a entrar na própria universidade.

Proibir o acesso de mulheres aos parques também impede que as crianças tenham oportunidade de lazer e exercício, de brincar ou de participar de atividades recreativas.

Uma jovem deslocada por um terramoto na província de Paktika, no Afeganistão.
© UNICEF/Sayed Bidel
Uma jovem deslocada por um terramoto na província de Paktika, no Afeganistão.

Confinar mulheres ao lar é o mesmo que mantê-las em cárcere

Os relatores das Nações Unidas afirmam que confinar mulheres ao lar é o equivalente a mantê-las prisioneiras o que poderá levar ao aumento da violência doméstica e a problemas de saúde mental.

Os homens que acompanham mulheres vestindo roupas coloridas ou sem a face coberta por um véu foram brutalmente espancados por funcionários do Talibã.

As autoridades do movimento islâmico estão jogando um gênero contra o outro ao encorajarem meninos e homens a controlarem o comportamento das mulheres, a forma como elas se vestem e como transitam em seus círculos sociais.

No texto, os relatores de direitos humanos dizem que isso pode obrigar os homens a punir as mulheres e meninas normalizando a violência contra elas.

Algumas defensoras de direitos humanos e mulheres que participaram de um protesto pacífico pelos direitos das afegãs estão sendo espancadas e presas ao se tornar alvos da violência.

Na terça-feira, 3 de novembro, uma entrevista à imprensa foi interrompida e os participantes presos. A ativista Zarifa Yaquobiand e quatro homens foram detidos pelo departamento de inteligência do Talibã.
ONU Geneva/Inès Alfaro
Na terça-feira, 3 de novembro, uma entrevista à imprensa foi interrompida e os participantes presos. A ativista Zarifa Yaquobiand e quatro homens foram detidos pelo departamento de inteligência do Talibã.

Defensora detida com mais quatro homens

Na terça-feira, 3 de novembro, uma entrevista à imprensa foi interrompida e os participantes presos. A ativista Zarifa Yaquobiand e quatro homens foram detidos pelo departamento de inteligência do Talibã.

Para os relatores de direitos humanos, essas ações devem ser investigadas como perseguição de gênero com base no direito internacional.

O grupo pediu ao Talibã que respeite suas obrigações internacionais e que implemente os padrões de direitos humanos incluindo o respeito aos direitos de todas as meninas e mulheres à educação, ao trabalho e à vida cultural.

Eles querem ainda a libertação imediata de Zarifa Yaquobi e dos detidos com ela ou o indiciamento do caso, além de contato com advogados e familiares.

No texto, eles exigem respeito aos direitos fundamentais das mulheres e o direito à reunião sem ataques, além da suspensão do decreto que pune homens da família por possíveis transgressões das mulheres e meninas.

Na semana passada, 14 pessoas na província de Logar forma castigadas dessa forma pelo Talibã.
© Unicef/Arezo Haidary
Na semana passada, 14 pessoas na província de Logar forma castigadas dessa forma pelo Talibã.

Apoio ao trabalho das defensoras de direitos humanos

Os relatores pediram a abertura imediata de todas as escolas secundárias para as meninas assim como o acesso à universidade. E a remoção das restrições a mulheres e meninas para o acesso a locais públicos.

O grupo também pediu à comunidade internacional que apoie as reivindicações e investigue os responsáveis por esse tratamento das mulheres no Afeganistão, aumentando o apoio ao trabalho das defensoras de direitos humanos no país assim como a garantia de que as mulheres participarão no processo de decisão afegão.

E em nota separada, o Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU se disse chocado com chibatadas em massa em praça pública pelas autoridades de facto do país.

Na semana passada, 14 pessoas na província de Logar forma castigadas dessa forma pelo Talibã.

A ONU pediu o fim imediato da prática que chamou de cruel, desumana e degradante, e que é proibida pela Convenção contra Tortura, que foi firmada e ratificada pelo Afeganistão.

*Os relatores de direitos humanos são independentes das Nações Unidas e não recebem salário pelo seu trabalho.