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Hostilidade a jornalistas alimenta ataques no Twitter  BR

Os investigadores também usaram ferramentas de análise de dados para estudar as contas de sete mulheres jornalistas e três do sexo masculino por país
© Unicef Moldova
Os investigadores também usaram ferramentas de análise de dados para estudar as contas de sete mulheres jornalistas e três do sexo masculino por país

Hostilidade a jornalistas alimenta ataques no Twitter 

Cultura e educação

Pesquisa pioneira sobre violência digital de gênero foi financiada por programa da Unesco; jornalistas mulheres enfrentam muitos mais ataques que questionam sua capacidade mental, usam expressões sexistas ou mencionam sua aparência física.  

Ataques no Twitter a trabalhadores da mídia da América Latina são alimentados pela hostilidade a jornalistas, especialmente contra mulheres atuando no ramo.  

Essa é uma das conclusões de uma pesquisa pioneira sobre violência digital de gênero financiada pelo Programa Internacional para o Desenvolvimento da Comunicação, uma iniciativa da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura, Unesco.

Conclusões 

O relatório indica que o efeito dos ataques é que muitos dos jornalistas entrevistados dizem que se autocensuram. 

Os ataques têm efeitos muito concretos em seu direito à liberdade de expressão
ONU/Violaine Martin
Os ataques têm efeitos muito concretos em seu direito à liberdade de expressão

O projeto, realizado entre abril de 2019 e abril de 2020, foi implementado pelas ONGs Sentido da Colômbia e pela Comunicación para la Igualdad da Argentina. 

A pesquisa analisou os relatos de 66 jornalistas que foram alvo de ataques online em países como Argentina, México, Colômbia, Uruguai, Paraguai, Venezuela e Nicarágua. 

Os investigadores também usaram ferramentas de análise de dados para estudar as contas de sete mulheres jornalistas e três do sexo masculino por país, complementadas com entrevistas a 28 profissionais. 

Segundo a Unesco, o estudo “não é necessariamente representativo da situação mais ampla, mas ajuda a sinalizar semelhanças e diferenças nos ataques e nas percepções dos jornalistas envolvidos.” 

Resultados 

Os resultados sugerem que o principal motivo do ataque são ideias políticas de uma jornalista e, em menor medida, seu trabalho profissional. A maioria dos estudados são acusados, independentemente do sexo, de trabalhar para um lado político ou outro. 

A análise relaciona esse fenômeno à especificidade do Twitter como um espaço dominado pelo conteúdo do debate político contemporâneo. A alta polarização na sociedade alimenta e é impulsionada pelos algoritmos das mídias sociais. 

Os ataques têm efeitos muito concretos em seu direito à liberdade de expressão. Mais de dois terços dos jornalistas entrevistados, cerca de 68%, restringiram a frequência de suas postagens, retiraram-se temporariamente da rede social ou pararam de postar sobre questões que poderiam gerar ataques. 

Essa violação da liberdade de expressão tem consequências para o resto da sociedade, pois sua retirada das mídias sociais, mesmo sendo temporária ou seletiva, silencia as vozes da esfera pública. 

Emoções  

A violência no Twitter também costuma ser acompanhada de ataques em outros lugares. Cerca de 75% dos jornalistas entrevistados disseram que também foram atacados ou ameaçados em outras redes sociais, em público ou por meio de seus telefones ou contas de e-mail. 

Muitos jornalistas criam estratégias pessoais, como retiradas temporárias ou seletivas, bloqueio de invasores ou limitação de leitura de notificações.  

A maioria deles entende que a violência faz parte das regras do jogo no Twitter, mas 95% afirmam ter sentido emoções negativas como raiva, medo ou vergonha como resultado dos ataques. 

Proteção 

Ao mesmo tempo, 86% dos jornalistas entrevistados relataram que seus empregadores não lhes deram nenhum treinamento digital antes dos ataques.  

Para um quarto dos entrevistados isso aconteceu posteriormente. Apenas 14,5% deles trabalhavam para meios de comunicação com protocolos de segurança digital.  

A violência contra jornalistas no Twitter também costuma ser acompanhada de ataques em outros lugares
ONU/Violaine Martin
A violência contra jornalistas no Twitter também costuma ser acompanhada de ataques em outros lugares

Gênero 

O estudo também mostrou que a violência digital difere de acordo com o gênero. 

Jornalistas mulheres enfrentam muitos mais ataques que questionam sua capacidade mental, mais 10% do que os homens, usam expressões sexistas, mais 20%, e mencionam sua aparência física, cerca de 30% a mais. Este indicador é duas vezes maior na Argentina e no Uruguai.  

As hashtags utilizadas para atacar jornalistas de sexo feminino incluem, em muitos casos, diminutivos de seus nomes, infantilizando-as, situação que não ocorreu em nenhum dos ataques a homens analisados ​​no âmbito deste estudo. 

Nenhum dos homens foi submetido a abuso sexual baseado em tecnologia, mas isso aconteceu a 5% das mulheres. Elas relataram a violência no Twitter muito mais do que seus colegas homens: 71% contra 43% do sexo oposto. 

Ao mesmo tempo, elas também foram mais ativas na modificação de suas práticas digitais, cerca de 62% mudaram suas atitudes, contra apenas 43% dos homens.  

O estudo também mostrou que jornalistas, principalmente mulheres, também são atacados especificamente por cobrir questões feministas, como a legalização do aborto.